Gaudêncio Torquato*
O partido que desfralda a bandeira da socialdemocracia e adota um tucano como símbolo, o PSDB, está em frangalhos. Quando foi criado em 1988 era a esperança de o país seguir pela trilha de uma nova política, amparada no conceito do Estado comprometido com o bem estar social e aberto aos investimentos privados. As prévias a que o partido se submete para escolha de seu candidato à presidência, em 2022, que deveria ser um exemplo de democracia partidária, tornaram-se uma dor de cabeça por falha grave no sistema contratado para operar o voto eletrônico. O PSDB encontra-se em um beco sem saída: seja qual for o vencedor, o partido estará rachado.
Não adianta alguns tentarem apagar o fogo. As alas em querela – comandadas pelos governadores de São Paulo e do Rio Grande do Sul, João Doria e Eduardo Leite – tocam fogo na floresta tucana e será difícil chegar-se a um ponto de união. Para complicar, um quadro histórico da sigla, Geraldo Alckmin, está prestes a migrar para outra entidade. O gesto parece um troco com juros e correção monetária pela maneira com que foi tratado. Apesar de acenos públicos de integração de propósitos, explicitados por seus comandantes, os grupos evidenciam forte cisão. O partido da social-democracia parece perdido.
O fato é que a crise vem de longe. É o tropeço vivido pelos sociais-democratas, que atravessam um escuro corredor, seja por falta de lideranças, seja por obsolescência de discurso, desmotivação do eleitorado e desunião de núcleos.
Fortes classes médias, as mais poderosas entidades e os contingentes laborais que vivem em São Paulo se ressentem da falta de um discurso consentâneo com suas expectativas. Afinal, qual é a mensagem do PSDB?
Ao ser concebida, a socialdemocracia brandia como escopo o estabelecimento do Estado de bem-estar social (baseado na universalização dos direitos sociais e laborais e financiado com políticas fiscais progressistas) e o aumento da capacidade aquisitiva da população.
O Brasil ingressou na rota. Hoje, as teias sociais estão sendo bem costuradas, programas de distribuição de renda passaram a frequentar a mesa de todos os núcleos, a ideia de extinguir a miséria continua acesa, e a receita do “velho socialismo” aparece de forma esporádica e sujeita a apupos.
A crise que consome o partido pega, de um modo geral, os entes políticos nacionais. Os grupamentos parlamentares padecem da síndrome da “atração fatal”, impulsionada pelas “tetas do Estado”. Que secam a olhos vistos com a economia em baixa, camadas sociais perdidas no meio do desemprego, orçamentos estourados e polarização política. Que tristeza!
* Gaudêncio Torquato é jornalista, escritor, professor titular da USP e consultor político