A síndrome do ninho vazio tem sido assunto recorrente aqui. Já falei sobre isso no ano passado quando tudo ainda era apenas uma possibilidade e depois, rapidamente, em algumas entrelinhas. Mas o que tem batido forte no meu coração e que nunca ouvi de ninguém é a forma torturante com que isso acontece.
Comparo ao luto: primeiro há o “grande rompimento”, que no caso da mudança é quando você coloca as malas no carro, descarrega ela em um outro lugar e vem embora mudo, como se o coração estivesse amarrado a uma corda pelo lado de fora e viesse quicando no asfalto, rasgando, ralando, literalmente despedaçando.
E, quando acha que já sofreu tudo que podia naquela viagem sem fim. Vem o dia a dia e eis que surgem as pequenas dores, tipo aquele corte que a gente faz no dedo com folha de sulfite sabe? Não dá para ver, mas pulsa cada vez que você mexe com as mãos. Vamos percebendo uma mudancinha ali, um buraco aqui, uma ausência acolá.
Quem é mãe de menina vai entender bem o que estou falando. Lá em casa é quase tudo compartilhado. Os sapatos, as roupas, a acetona, o creme de cabelo… Além disso, para facilitar a logística, já marca a depilação, a sobrancelha, o cabeleireiro, a academia, a costureira. Tudo no mesmo horário, portanto, onde vai uma vai a outra. E o que, por vezes, era um tormento, passa a ser saudade. O cérebro, minha gente, este danado, momentaneamente apaga os desgostos e só faz pulsar aquele amor romântico como se tudo isso tivesse sido sempre flores e essa falta de memória só aumenta o buraco negro.
Eu juro que me preparei. Sabia que aconteceria tanto pela personalidade da Gabi quanto pelas aspirações. Ela é do mundo, é feliz no mundo. Perdi as contas de quantas conversas tive sobre isso na terapia. Mas nada, nada é suficiente quando a saudade bate forte.
Inevitavelmente nossos filhos vão estreitando vínculos nos lugares onde estão inseridos e relacionamentos custam tempo. Então, naquele final de semana que você tinha se programado para o macarrão ao molho pesto, surge um aniversário. É natural, é compreensível, mas dolorido.
Vale ressaltar aqui que tenho uma personalidade intensa e que pode ter sido de forma bem mais leve para as outras pessoas. Para mim, quase nocaute. Um dia estava num restaurante e fiquei observando uma mãe insistindo para a criança comer, naquele empenho comum a nós. Minha vontade era ir até lá e dizer para ela “não faz força não, daqui a pouco ele cresce e vai embora, não importa o que tenha feito, come tranquila e deixa para lá”.
Mas importa e sei que muito. Sentir-se amado e parte de uma família é proporcional à coragem de cair no mundo. A gente só tem essa força porque vem de base sólida, porque foi despertado em nós a nossa capacidade de ser, de querer e viver. A gente só voa porque tem a certeza do paraquedas.