quinta-feira, novembro 21, 2024
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As minhas coisas não são nossas

Dia desses ganhei dois chocolates da minha tia. Como cheguei em casa já era bem tarde da noite, coloquei-os sobre o móvel da sala e fui dormir. Seguindo a rotina, saí logo cedo no dia seguinte e, quando retornei, alegremente meu cérebro comemorou: “Agora é a hora, Bárbara. Vamos sentar e comer aquele docinho enquanto respira depois de um dia de trabalho. A vida é boa! Você merece”. Nós só esquecemos de combinar com a Gabi.

A verdade é que quando fui procurar pelos chocolates, não achei nem o cheiro… Nem a embalagem vazia para falar a verdade. Eu fiquei tão brava, mas tão brava, que na hora gravei uma mensagem que virou meme lá em casa.

Parece bobagem e até é, mas que não era só um chocolate, era algo que eu tinha ganhado com carinho, que fazia parte do contexto da noite que havia tido com minha tia e ele fazia parte daquilo, entende? Fora isso, precisava mesmo comer os dois inteirinhos?

E como são as gotas que fazem o copo transbordar, soltei um “as minhas coisas não são nossas”, no desespero de que lembrasse que, além de mãe, sou indivíduo e que não gostaria de dividir o tempo todo.

Dá até vergonha de contar, mas a verdade é que já briguei até por creme de cabelo. Vejam bem, eu tenho um cisco de fios e curtos e quase zero de tempo de usar a máscara de hidratação. Já a Gabi passou três vezes na fila da peruca, tem muito e longo e, como todo adolescente, tardes disponíveis. Acontece que, quando vou usar, só acho pote vazio. Acontece muito também de perceber que meu shampoo saiu andando só depois que já entrei embaixo do chuveiro e estou molhada…

Só sei que a vida ensina. Todos esses meus sentimentos são verdadeiros e foram reais. A grande maluquice é que a transitoriedade, a frequência com que as coisas mudam de lugar nos obriga a rever prioridades e aquilo que incomoda em determinado momento, traz um vazio lascado em outro.

Num final de semana recente encontrei vestígios de filhos quando fui usar meu banheiro. Tinha roupa e piso bem molhado e, se antes isso tinha chance de me deixar irritada, agora trouxe paz ao meu coração, provocou aquele sorriso bobo de canto de boca porque essa bagunça significa presença, mostra casa cheia, convivência, normalidade.

E quantas vezes a gente passa por isso com a maternidade! Aquela vontade que o bebê passe a dormir a noite inteira, a liberdade de andar sozinho, o desmame. Refletia sobre isso enquanto buscava o Neto numa dessas madrugadas. Como tenho a experiência com a Gabi, sei que meu tempo de perambular de pijama noite a dentro pelas ruas está acabando e, se antes isso me trouxesse desconforto, hoje extasia, faço saltitante. É verdadeiro que a gente se cansa e por isso quer mudança, quer subir um degrau, mas tão verdadeiro quanto é quando elas chegam, trazem desconforto e dias a menos.

 

 

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