sábado, novembro 23, 2024

Pode ser

A vida inteira a gente ouve que filho é uma pessoa a parte. É um indivíduo e não a continuação de nós mesmos. Na teoria isso é muito fácil, mas na prática confesso que nem tanto. Por vezes chega a ser incompreensível você se dedicar tanto a alguém que tem gostos e toma decisões completamente diferentes daquelas que nós tomaríamos e que desce arranhando a garganta.

Confesso que estou numa fase que mais da metade das coisas não são como eu gostaria. Não que sejam ruins, de forma alguma. Elas são comuns à idade e a quem eles são. Acho até que passam pela expectativa subconsciente que armazenamos dos personagens ao longo da vida. E esse desconforto passa pelo que eles comem, a hora que comem, pelo dormir, pelo se organizar, pelo…. pelo… pelo… pelo!

Outro dia fui levar o Neto para a casa de um amigo que mora em um condomínio. Quando passei pela portaria, tinha um carro parado cheio de moleques dentro. Resumindo a história, era o amigo, ainda desabilitado, com o veículo potente do pai, à noite, com chuva, num lugar em que animais e crianças andam despreocupados pela sensação de segurança. Pensa numa pessoa que ficou brava, muito brava e que, cuja vontade, era fazer meia volta e trazê-lo para a casa. Não fiz!

Mesmo com o coração bem apertado, acredito que, a partir de agora, só posso ajudá-lo nas escolhas e a melhor forma de fazer isso é sendo alguém em quem ele vê coerência e gosta de ter por perto. Só no dia seguinte, depois que ele contou todas as histórias do churrasco, que eu e o Alisson fomos pontuando o potencial que aquela atitude “dá hora” do amigo tinha de dar ruim. Deu tempo e sigo na esperança que sempre dê.

Olha, posso dizer que até sou boa na arte de respeitar a individualidade, mas confesso que, enquanto conseguia, rolava uma sabotagenzinha. Quando criança sempre permiti que escolhessem as próprias roupas, mas sempre fazia um filtrão antes. Dava aquela pré-selecionada e só mostrava as que achavam que eram decentes, que seriam mais usadas, que achava mais bonita e que o preço condizia.

Agora, senhor, na maior parte das vezes nem vou junto. Aí, quando as peças começam a sair da sacola eu já internalizo o silêncio, já firmo na respiração para não ser impulsiva. Tem vezes que preciso de muita, mas muita, mas muita concentração para dominar o “Incrível Hulk” que habita em mim.

Sabe que enquanto refletia sobre isso, para poder escrever, meu cérebro trouxe à tona uma imagem da minha mãe dizendo um “o que vocês vão fazer?”, seguido de um “pode ser”. Compreendi que aquele rosto quase inexpressivo, congelado, proferindo poucas palavras é o mesmo que o meu.

Claro que, pelos anos, ela já deve estar muito melhor nisso, e não deve ficar ruminando a minha decisão assim como fico fazendo com meus filhos. Mas só agora enxerguei isso: quantos “tudo bem” ela deve ter me dito e deve dizer ainda. Mas com vontade de soltar um : “escuta aqui mocinha”. Acho que, hoje em dia, no mínimo uma vez na semana. Fica tranquila, mãe. Está dando tudo certo! rsrsrsrs

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