A primeira escola foi fundada Antes de Cristo movida pela necessidade em formar pessoas capacitadas a organizar negócios e administrar as cidades. Além disso, a escola existe com a finalidade de inserir as crianças em um círculo social, em que ela irá conhecer estranhos e obedecer regras, ou seja, um espaço de formação humana.
Confesso que olhar para essa base teórica de constituição me encanta. Por outro lado, passa a entristecer quando penso que a medida para o sucesso do proposto ali são notas, muito mais do que a preocupação com o humano que há por trás dela. Entendo que talvez seja necessário ter métricas, mas não compreendo quando elas perdem a finalidade tornando-se um jogo de bobo.
Muito mais que absorver aprendizado, o aluno precisa ter nota. Por sua vez, muito mais que aprender, o aluno também está preocupado em atingir a pontuação necessária para pular de fase naquilo. Do lado de cá, os pais esperam resultado e mais que isso, não precisar gastar energia. Boletim bom, todo mundo feliz: professor, aluno e família.
Já contei o caso da Gabi aqui, quando descobrimos a falha no processamento auditivo. Ao entrar em contato com a escola, a primeira coisa que ouvi foi que “estava procurando ‘pelo em ovos’, que ela era uma aluna da média”. Era mesmo, mas esse não é meu valor e, nitidamente, percebia que havia problemas cada vez que ela fazia lição de casa. Suas notas não refletiam seu sofrimento, para mim, infinitamente, mais importante do que estar na média.
Anos depois percebemos algo indigesto na rotina do Neto. Como o segundo filho cresce com o privilégio da experiência, corremos levá-lo para fazer os mesmos exames. Não havia nada, apenas um desenquadramento no grupo.
E foi vendo como era o processo psicopedagógico que o Alisson teve a percepção de passar pelos testes. Vejam bem, durante sua vida escolar não foi um bom aluno, repetiu mais de uma vez e fazia o que dava. Fez parte dos denominados pelo senso comum como “é burro e não gosta de estudar”. A verdade é que ele carrega a maior parte dessas dificuldades pedagógicas que hoje tem nome, como o déficit de atenção. A escola para o tipo de funcionamento cerebral dele era um campo de guerra misturado com a exibição de um filme 3D assistido sem óculos.
Vejam bem, ele é uma das pessoas mais inteligentes que conheço. É super-informado, sabe contextualizar os cenários atuais com a história, conhece as palavras pela base, é empreendedor e tem uma coordenação motora invejável. Mas não era apto com as notas e isso foi tudo que conseguiram perceber!
Quando dei aula no cursinho tinha uma aluna que fazia algumas trocas na escrita, como “v” com “p”. Fui falar com ela sobre isso e acreditem, nunca ninguém havia notado. Minha gente, falo de alguém que passou mais de 10 anos em sala de aula sem ser notada!
A gente sobrevive, guarda as dificuldades na mala e segue. Alguns tem a alegria de encontrar com a solução em alguma esquina. Já outros, além das próprias limitações, levam para o túmulo o estigma de não ser como a maioria é. Repito: não somos farinha do mesmo saco.