Recentemente, depois de uma conversa com estudantes, em São Paulo, fui abordado por um universitário. Leitor voraz, inteligente e apaixonado, seus olhos emitiam um sinal de desalento. “Deixei de ler jornais”, disse de supetão. “Não adianta o trabalho da imprensa”, prosseguiu meu jovem interlocutor. “A impunidade venceu”. Referia-se à vitória dos mensaleiros no Supremo Tribunal Federal. Confesso, caro leitor, que meu otimismo natural estremeceu. Não se tratava do comentário de alguém situado no lusco-fusco da existência. Não. Era o diagnóstico de quem está nascendo para a vida. Por uns momentos, talvez excessivamente longos, uma pesada cortina toldou o meu espírito.
Acabei reagindo, pois acredito na imensa capacidade humana de reconstruir a ordem social. Estou convencido de que os países construídos sobre os valores da verdade e da liberdade têm demonstrado maior capacidade de superação. E o Brasil, não obstante os reiterados esforços de implosão da verdade (a mentira e o cinismo tomaram conta da vida pública) e de destruição da liberdade (a desmoralização programada das instituições democráticas e a transformação das imensas massas de excluídos em instrumentos do marketing populista), ainda conserva importantes reservas éticas.
A simples leitura dos jornais oferece um quadro assustador do cinismo que se instalou na entranha do poder. Os criminosos, confiados nos precedentes da impunidade, já não se preocupam em apagar as suas impressões digitais. Tudo é feito às escâncaras, num processo programado de corrosão da democracia. Valores e princípios são mandados para o espaço. O que importa é não soltar o poder. Os lulopetistas sempre menosprezaram os prejuízos eleitorais decorrentes do mensalão.
Eles afirmam que, mesmo depois da descoberta do esquema, Lula conquistou duas vezes a Presidência da República e elegeu Dilma sua sucessora. O mesmo discurso foi entoado pelos advogados dos mensaleiros. Dilma, aparentemente, é mais recatada. Mas as ações concretas da presidente da República mostram que sua visão ética da vida pública é a mesma de Lula: Vale tudo!
Mas não é somente a impunidade que conspira contra os valores democráticos. Um dos últimos capítulos da novela de desestabilização das instituições foi o espetáculo de vandalismo patrocinado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que transformou a Praça dos Três Poderes, em Brasília, num campo de batalha. Tudo começou com uma passeata de protesto contra o governo e a prisão dos mensaleiros.
Mas não demorou para o MST mostrar sua verdadeira cara: 15000 militantes marcharam até a sede do Supremo Tribunal Federal, tentaram invadir o Palácio de Planalto e atacaram policiais militares, num confronto que resultou em 42 feridos, entre PMs e manifestantes.
A reação do governo indica o apreço das autoridades pelas instituições democráticas: os militantes foram recebidos pela presidente da República como se nada tivesse acontecido. Mas a coisa foi mais longe: Gilberto Carvalho, braço de Lula no ministério de Dilma, afirmou que o governo continuará financiando o MST.
Resumo da ópera: recurso público, o seu dinheiro, amigo leitor, deve ser usado para financiar entidades que caminham na contramão dos valores democráticos. A ação do MST não foi um uma explosão irresponsável de vandalismo. Foi uma estratégia de desmoralização da democracia. E o que fez a presidente da República? Acariciou os baderneiros e abriu o caixa para financiar a bagunça.
O que espanta, caro leitor, é a covardia e ausência de propostas de amplos setores da oposição. Como cães sem raça, ladram, mas não mordem. Transmitem a sensação de que há muito rabo preso nos bastidores da Ilha da Fantasia. A sociedade está cansada de tanta inconsistência, de tanto jogo de faz-de-conta, de tanto cinismo. Quer mudança.
Mas as eleições estão aí. É preciso votar bem. Renovar, profundamente, o cenário nacional. Não devemos votar em candidatos sob suspeição, em políticos indiciados, em oportunistas ou covardes. Verdade, liberdade e cidadania podem fazer do Brasil um grande país. Só depende de cada um de nós.
Carlos Alberto Di Franco, diretor do Departamento de Comunicação do Instituto Internacional de Ciência Sociais – IICS e doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra, é diretor da Di Franco – Consultoria em Estratégia de Mídia ([email protected])