No dia 20 de novembro, o Brasil entra em conflito com sua história. É o Dia da Consciência Negra. Em 2021, a data chega a 10 anos de sua instituição oficial no calendário nacional mesmo que, desde 2003, esteja no calendário escolar. E também neste ano é celebrado o 50º aniversário da criação da Fundação Palmares, fundada em homenagem a Zumbi, líder do quilombo dos Palmares morto exatamente em 20 de novembro de 1695, gerando assim a escolha da data.
Não é fácil tratar deste assunto no Brasil. O racismo é uma instituição sólida em nosso país. Foram quase 400 anos de escravidão oficializada, em um processo que fez do Brasil a maior potência escravocrata do planeta. O tráfico negreiro foi um dos principais negócios do país por séculos, garantindo a riqueza daqueles que capturavam africanos e traziam para cá.
Também foi o meio de sustento das principais famílias brasileiras, já que era através da força braçal de seus escravos que geravam seus produtos e, consequemente, seus lucros. A escravidão foi a instituição mais sólida do Brasil e, por anos e anos, muitos negros, como Zumbi, lutaram pela liberdade.
Ela foi atingida de maneira oficial, em 1888, após a assinatura da Lei Áurea. Mas a Princesa Isabel ficou com os louros de uma batalha que custou muito suor, sangue e vidas a incontáveis negros. Uns, anônimos. Outros, pouco conhecidos, como Benedito Meia-Légua. E os mais famosos, como André Rebouças, José do Patrocínio e Luiz Gama. Fato é que, mesmo com a abolição, a questão do negro no Brasil seguiu o roteiro escrito pelas elites.
Não houve um centímetro de indenização aos escravos, que foram largados à sorte após o fim da escravidão. Toda a desigualdade social, exposta por uma maioria negra entre os mais pobres e uma minoria branca entre os mais ricos, é consequência desta linha do tempo. Assim como as várias formas de preconceito ainda incrustadas em nossa sociedade.
Entre elas, as tentativas de causar o apagamento histórico destes séculos de escravidão, inclusive, colocando sobre os próprios negros o fardo de terem escravizados os seus pares na África, absolvendo aqueles que realmente se fartaram desta prática abominável.
Há a tentativa de burlar o espaço tempo e “fingir” demência ao negar que a desigualdade de hoje é fruto da escravidão de ontem. Apelam para o discurso de “mi mi mi”, a muleta que expõe aqueles que, lá pelo século XIX, estariam garantindo que certa lei ficasse mesmo só para inglês ver…
Por tudo o que a população negra do Brasil sofreu por décadas e décadas, um dia só de reflexão é pouco. Mas é alguma coisa. Que neste 20 de novembro coloquemos a mão na consciência e percebamos o quanto é necessário que se recorde sempre aquilo que é fato: o Brasil ainda não se desapegou das consequências escravagistas e continua tão racista quanto sempre foi. Que se martele esse prego resistente até que se apague a última chama de distinção racial que incendeia este país desde a sua formação.