Com as eleições se aproximando, é bastante comum lermos e ouvirmos que devemos eleger políticos com a ficha limpa e que possuam experiência no exercício de cargos públicos. Tudo isso é relevante, mas nem de longe toca no ponto fundamental, infelizmente pouco debatido: que tipo de valores cada candidato incorpora em sua atuação pública?
Para pensar de maneira produtiva sobre esse assunto, convém lembrar que a classe política exerce a administração de uma entidade chamada Estado, que existe para cumprir uma série de objetivos a ele inerente (isto é, que fazem parte da própria natureza do Estado, independentemente de quem o administre). Assim, os melhores candidatos serão aqueles que, de maneira consciente, melhor aptidão apresentarem para realizar esses objetivos; vejamos, agora, quais são os principais.
Em primeiro lugar, é necessário reconhecer que nossa época é marcada pela multiplicidade e variedade de projetos de vida, que devem ser harmonizados de modo a possibilitar uma convivência pacífica entre pessoas e grupos. Daí deriva o primeiro princípio fundamental do Estado: promover e difundir a paz. Para que isso seja possível, é necessário que certos direitos humanos fundamentais e universais sejam respeitados, a começar pelo direito humano à vida em todas as suas manifestações, pois o respeito à existência do outro é a base de todos os demais direitos.
Desse modo, se determinado membro da classe política não atua em prol do direito à vida, ele atenta contra a própria noção de direito (que se baseia em relações bilaterais entre indivíduos), violando uma das finalidades básicas do Estado.
Outra maneira bastante clara de trabalhar na contramão da paz social é promover a criação ou o incentivo de conflitos baseados na violência e na força bruta (como os injustificáveis casos de vandalismo que temos presenciado nos últimos tempos) e não em propostas claras (isto é, não vagas) de aprimoramento das instituições em benefício de todos. Políticos que atuam nesse sentido trabalham contra as finalidades do Estado.
Conjuntamente com a paz, o Estado deve zelar pelas liberdades dos cidadãos a ele submetidos, como liberdade de expressão, de locomoção e de organização. Em relação a esta última, cabe notar que o próprio Estado (também designado como sociedade política) consiste em uma sociedade de sociedades, integrando famílias, empresas, clubes, partidos políticos, organizações não governamentais e pessoas jurídicas de todos os tipos em prol do bem comum.
Cada uma das sociedades que se submete à sociedade política deve ser livremente constituída e ter a possibilidade de desempenhar as atividades que lhe são próprias, bem como deve ter a possibilidade de elaborar as normas necessárias para seu funcionamento, uma vez que é da natureza de qualquer associação elaborar normas. Daí deriva o chamado princípio da subsidiariedade, que consiste na forte recomendação de que o Estado desempenhe apenas as atividades que as sociedades menores forem incapazes de desempenhar e de que se abstenha de regular aquilo que estas puderem regular.
Por exemplo, se um político – atuando em Brasília – defender a aprovação de normas públicas ainda mais detalhadas sobre educação doméstica e relações entre pais e filhos, ele estará ferindo o princípio da subsidiariedade e – por conseguinte – a própria ideia de liberdade e os fins do Estado.
Finalmente, o Estado, atuando em prol da harmonia social, deve incentivar (mas nunca forçar, uma vez que nenhuma virtude é criada pela força) o auxílio mútuo entre seus membros, tanto no campo material quanto emocional. Parece, assim, razoável que um médico ou advogado recém-formado receba incentivos para iniciar sua carreira atendendo a população de baixa renda, mas não que seja coagido pelo Estado a fazê-lo. Destarte, se um político incentiva a infusão de virtudes por meio da coação estatal, recomenda a prudência que ele não seja reconduzido a nenhum cargo eletivo.
Esperamos, com essas breves notas, enriquecer a reflexão do leitor sobre os diversos fatores a serem avaliados na hora de bem escolher seu voto e de cobrar determinadas atitudes daqueles que vierem a ser eleitos. Afinal, é difícil tanto escolher quanto cobrar quando o discurso não vai além do “lutarei por mais emprego, saúde e educação”.
Fabio Florence ([email protected]), 29 anos, mestre pela Unicamp e bacharel em direito pela PUC-Campinas, é professor de filosofia do Colégio Etapa e gestor do núcleo de história do IFE Campinas.