Recentemente, fiz uma apresentação sobre direito e governança ética. No momento das perguntas, fui questionado sobre as relações entre as pautas sociais, os grupos de pressão e a resposta governamental, respondendo que “uma governança ética pressupõe o diálogo entre governo e sociedade e, quando as pautas sociais e os grupos de pressão utilizam métodos ‘femenazis’ de ‘argumentação’ para impor suas demandas, a melhor saída está em suspender a mesa de debates até que o diálogo se restabeleça”.
Emendei a resposta lembrando Arendt, para quem “poder democrático e violência são opostos; onde um reina absoluto, o outro está ausente”. Parêntesis: a expressão “femenazi” é uma aglutinação formada a partir do nome do grupo feminista “femen” com a palavra “nazismo”. De repente, lá do fundo, ouvi alguém exclamar: “você é um conservador!”.
Conservador é um bom termo de insulto. Vivemos em tempos absolutamente progressistas, nos quais depositamos nossa fé política numa crescente concentração estatal de poder. O conservador é a pedra no meio desse caminho rumo ao progresso. E aqui está o tom vulgar do insulto: o conservador como um sujeito obscurantista, retrógrado e reacionário.
Atualmente, temos três posturas predominantes: o reacionário, que defende uma visão idealizada do passado; o progressista e o conservador, que procura, sempre diante da perspectiva de mudança do cenário social, preservar um certo rol de princípios fundamentais e, assim, aceita, por reformas gradativas, as modificações culturais ou sociais.
Logo, o conservador não propõe conservar tudo como está, mas tem o espírito atento aos sinais das épocas. Essa postura também emerge, mas reativamente, em momentos de particular dramatismo e ameaça para as instituições que sobreviveram aos “testes do tempo”. Nesse ponto, o conservador seria, nas fábulas infantis, a princesa: só com o beijo do príncipe, a donzela despertaria.
Em suma, o conservador é o que defende o mundo presente e as suas instituições, não porque esse mundo corresponde estritamente a um “projeto conservador de poder”, mas porque as instituições, os valores e os princípios ainda se mostram necessários para a preservação desse mundo tal como vivemos.
Feliz será a sociedade que se mostrar capaz de preservar suas tradições úteis, porque serão essas a apontar os caminhos possíveis para a resolução dos problemas mais imediatos, sem que nos deixemos levar pelo canto da sereia das soluções concentradoras de poder e supostamente iluminadas que, em regra, qualificam a retórica progressista. Com respeito à divergência, é o que penso.
André Gonçalves Fernandes é juiz de direito, mestre em filosofia e história da educação, pesquisador, professor do IICS-CEU Escola de Direito, membro da Comissão Especial de Ensino Jurídico da OAB/SP e coordenador do IFE CAMPINAS ([email protected]).