Por Creso de Franco Peixoto
A evolução tecnológica altera costumes. Condução veicular inclusa. Celular, aplicativo da direção, apesar da proibição e campanhas midiáticas. Motoristas falam com mão sobre uma orelha. Vistos com cabeça ligeiramente inclinada para frente, dá até para perceber movimento dos olhos para baixo e para cima, tentando manter pretensa segurança. Supõem-se suficientemente prestidigitadores para evitar multas.
A multa passou de média para gravíssima em 2009, com o dobro do valor financeiro (OESP;C4; 26/11/2009). Em cinco anos, o que se vê é a tendência de acobertar e não de se evitar o uso. Pesquisa da FEI publicada em 2011 estima 4,5 s para o motorista pegar o celular e ler o número de quem o chama. Para digitar 2 algarismos, 2 s; mais que o dobro do tempo para perceber e reagir perante iminente impacto em via urbana, que é de ¾ s (Correio Braziliense; p. 21; 6/12/2011). Segundo novas pesquisas da FEI em 2015, agravam-se as condições.
Os cenários desta nova simulação consideram o uso do celular para acessar aplicativo com dois toques, digitar palavra de cinco letras em teclado touch-screen e desvio de percurso gerado por desatenção; carro desgovernado. O tempo médio para dar dois toques foi de 5,2 s, elevação de 3,2 s (160%) em relação à pesquisa anterior. O tempo para digitar uma palavra de cinco letras foi de 4,8 s; 6,4 vezes acima da referência. O tempo médio para o carro “desgovernado” atingir o limite da faixa de tráfego foi de 6,9 s.
Descontou-se 1,3 s das leituras, referente ao tempo de leitura do cronômetro. Manteve-se respeito ao artigo 252/CTB em função do teclado de simulação ter sido colado sobre a direção: mãos no volante. Quanto à segurança, artigo 169/CTB, cumprido: pesquisa em longo trecho retilíneo de rodovia de baixo volume de tráfego, fora de horário pico e pavimento regular e íntegro. A diferença tecnológica entre celulares influencia. O teclado touchscreen exige olhar para a tela. No antigo, de botões, tato e memória não ocupam tanto a visão.
Pesquisou-se também a ocorrência de uso em rodovia, em veículos sob excesso de velocidade, em pista dupla paulista limitada em 110 km/h. Motoristas interagindo no celular: 17%, provavelmente digitando: 3,5%. Das amostras estudadas, 35% apresentavam vidros escuros. A porcentagem de motoristas que interagia com celulares é alta, indicando despreocupação com o risco e com a probabilidade de serem multados.
Campanhas precisam focar os riscos ainda maiores em alta velocidade e que a prática do “é melhor digitar do que falar porque é mais fácil para se acobertar” torna iminente um acidente onde a perda veicular é o fato menos importante. Há ainda o aspecto cognitivo. Ao se interagir com celulares ou similares enquanto se guia, a atenção é dividida entre pára-brisa e teclado.
O uso de tecnologias mais recentes em cockpit veicular, tais como bluetooth, para evitar o manuseio de aparelhos bem como softwares de interação por voz com o motorista, que avaliam a forma de falar e até a entonação, podem reduzir sensivelmente o risco de digitar, guiar com sono ou até sob ação de substância no sangue que possa alterar o grau de atenção. Afinal, o objetivo final é a minimização dos graves acidentes, quando o protagonista deveria estar apenas nos bolsos dos motoristas.
Creso de Franco Peixoto é Mestre em Transportes e professor de Engenharia Civil da FEI