Por Bárbara Andrade
– é empresária, formada em Jornalismo, pós-graduanda em Psicologia e Coach
– foi vice-presidente da Associação Civil Sanquim até 2019 e professora voluntária de Redação.
– [email protected]
Lá se vão cinco meses que minha Cidinha se foi e pensei que eu e sua morte havíamos estabelecido uma relação de cordialidade. Por alguns dias, consegui falar menos sobre ela e quase sem choro, na maior parte das vezes. Também arrisquei avisar a família que, mesmo com atraso, faríamos nossa tradicional feijoada. Mas não deu.
Já disse aqui em outros momentos que não sou ligada em datas comemorativas, que para mim faz mais sentido como se vive todos os dias, tanto que, pasmem, nem lembrei de usar este espaço para falar do que mais faço aqui, minha maternidade. Mas, talvez meu inconsciente não funcione da mesma forma. Digamos que não estejamos tão entrosados nisso. A verdade é que na semana anterior ao Dia das Mães fui acometida por uma alergia respiratória daquelas.
A impressão que tenho é a de que, desde então, estou vivendo com um elefante obeso nas costas. Viver está muito cansativo. Calma, isso não é uma carta de despedida e nem estou deixando nas entrelinhas que não quero mais estar aqui. Fisicamente meu corpo está lento, tenho vontade de chorar cada vez que reconheço qualquer demanda que dependa de mim, seja lavar um copo ou refogar o arroz. Ele pede por cama, mas o sono, ah, esse danado tem usado as noites para abrir caixinhas há tempo deixadas lacradas no quartinho das emoções.
Outra curiosidade deste período é que, para conseguir ficar o máximo de tempo sem tossir e machucar mais ainda minha laringe, preciso fazer silêncio! Sim, logo eu que gosto tanto de traduzir a vida em palavras estou passando por isso muda. Restam-me apenas as vozes internas, por vezes extenuantes e cruéis.
Demorei para perceber o que estava acontecendo! Achei que era só mais uma gripe, fiz teste de Covid, tomei xarope caseiro, inalação… mas nada acalmava essa bagunça interna. Tudo só fez sentido no dia que as herdeiras foram ao cartório assinar a venda da casa, o único bem físico de Cidinha em 83 anos de vida, um troféu que, ainda demente, ela fazia questão de ostentar.
Mais uma vez me perdi no choro. Mais uma vez vivi seu luto tão intenso quanto aquele de dezembro. Aquelas paredes testemunhas de tantas histórias, aquele quintal palco de festas americanas, jogos de vôlei, aquela cozinha da polenta, do brigadeiro, do pão de calabresa, do manjar… agora mais nada dirão sobre nós. Um sentimento de “acabou de vez”.
Meu cérebro, maluco que só, fica a todo minuto me levando para o sofá daquela casa, num dia corriqueiro de semana quando eu deitava com cabeça no colo do meu vô e os pés no colo da minha avó, cena que repeti até adulta. Não quer arredar o pé dali, num desespero de que nada daquilo acabe.
Fico por um tempo. Curto, sinto, até que consigo, docemente, dizer para mim mesma que precisamos voltar ao presente, que agora a história mudou de cenário, que mudei de papel. Assim, delicadamente, sigo…