De volta ao Boteco, o ex-zagueiro José Márcio Rottoli Mansur, o Zé Márcio, recorda aventuras tensas e curiosas durante sua passagem pelo Itumbiara, de Goiás.
Boteco – Como foi a aventura no Itumbiara?
Zé Márcio – Eles estavam montando o time. Levaram nós para a república, moravam os jogadores lá. Fomos jogar contra Goianésia. Era até uma rivalidade, amistoso. Ganhamos de 1 a 0. Eu fiz o gol de cabeça. Os caras ficaram loucos. E o Odilon acabou com o jogo. Estreia nossa. Aí eu cheguei no presidente: “não vou ficar nessa pensão, os caras ficam a noite inteira tocando violão, cantando, brincando, eu não sei fazer isso, não gosto”. “Vou arrumar um hotel pra você”. Tinha um menininho que ficava na pensão. O Odilon gostava de uma pinga e comprou uma garrafa, guardava, tomava, menininho viu e contou. Ele contava tudo pro presidente. Mandaram o Odilon embora. Aí eu fiquei perdido. Os outros eu não conhecia. Treinamos a semana inteira, teve outro jogo, joguei meio tempo, saí. Presidente me chamou. “Eu pedi para tirar você, vamos conversar. Te pago tanto”. Quase caí da cadeira. Nossa, tudo isso? Mas eu falei: “o passe é meu, né?”. “Não, do Itumbiara”. “Então, não, eu gosto de jogar com o passe livre”. “Eu aumento um pouco e o passe é do Itumbiara. Te dou tanto por mês e tanto na mão”. Eu pensei, esse cara é louco, era riquíssimo. Aí falei: “tá bom, mas tenho que ir pra Mogi porque meu pai tem que assinar”. O negócio de hotel morreu, eu continuei na república, acostumei com os caras. Você saia da república, atravessava a zona para chegar no campo porque cortava caminho. Nós vamos atravessar a zona, duas mulheres mortas no chão. “Que isso?”. “Aqui é assim, se bobear, um mata o outro”. No outro dia, outra mulher morta na zona. Aí ficamos sabendo: o cara chegou lá, ela tava com outro, o cara matou ela. Matou mulher de zona porque tava com outro, nunca vi isso. Eu era bem medroso. E começou a entrar na minha cabeça: o que eu tô fazendo aqui. Uma noite nós vamos num bar tomar uma Coca, um cara dá 2 tiros no outro. Mas cinco, 10 metros de mim. Aquela correria.
Boteco – Mas era o lugar que você estava ou a cidade toda?
Zé Márcio – A cidade, a gente tava no Centro. Aí pensei: vou embora. Fui lá falar com o presidente. Se eu falasse pra ele que ia para Mogi no sábado e o jogo domingo? Deixa pra ir segunda, né? Mas eu não aguentava mais. “Minha mãe não tá boa, me arruma 50 reais aí, que é só a passagem. E o senhor já dá o contrato, eu levo, meu pai assina”. Ele: “não, só segunda”. Cheguei, fui para a pensão, fiz a mala, tinha 30 contos no bolso. Parei na rodoviária, esperto, né, eu fiz a barba, tirei o dinheiro da passagem, o dinheiro deu certinho até Campinas.
Boteco – Por que você quis fazer a barba?
Zé Márcio – Eu era muito cheio de coisas. Uma hora da manhã, o ônibus no trevo de Limeira, eu sem comer, sem um tostão. Antes de Limeira, tem um posto, onde os ônibus param. Eu comi dois restos de lanche que vi num prato, eu sem dinheiro, vou pedir pros outros? Daquele tamanho, roupa bonita? Pensei, se eu for até Campinas essa hora, o que eu vou fazer lá? Fiquei no trevo, passaram uns 10 carros, capaz que iam me dar carona… Voltei lá no posto. Falei pro homem: “tô viajando faz tempo, sem dinheiro. Tem jeito de eu subir nesse caminhão e dormir na carroceria e de manhã eu me viro?”. “Tudo bem”. Passou um pouco, na hora que eu tava pegando no sono: “oh Mogi Mirim, oh Mogi Mirim. Tem um táxi aí de Mogi pondo gasolina”. Pulei lá. O táxi era um senhor que já faleceu, morava do lado da casa do meu avô, a família dele era amicíssima da minha mãe e do meu pai. “Oh, você é neto do Seo Angelin, né?”. “Sou, então, tô sem dinheiro”. “Que dinheiro, o quê? Monta aí, vamo embora, tô indo para Mogi, fiz uma corrida boa”. Deixou eu na porta de casa. Aí eu peguei trauma, não saio mais de Mogi.
Boteco – Zé Márcio volta para contar como acabou detido por engano, fugiu da delegacia e teve que responder a um processo depois de uma guerra campal no jogo entre Amparo e Pirassununga, quando era zagueiro da equipe amparense.