A transferência do imóvel da unidade da semiliberdade da Fundação Casa (antiga Febem) da Rua Santa Cruz para a Rua Paulo César de Campos Lovo, no bairro Saúde, prevista para ocorrer até outubro, está causando pavor nos futuros vizinhos. O contrato de aluguel do imóvel começou a vigorar na quinta-feira. Hoje são 22 internos e a capacidade máxima é 23. São adolescentes que cometeram atos infracionais leves, como furtos, tráficos e roubos, estão na primeira passagem e têm em média de 14 a 16 anos. Localizado próximo à Praça José Schincariol, a Praça do Fórum, o imóvel já foi utilizado como gabinete do prefeito Gustavo Stupp e estava desabitado. A unidade funciona desde 2008 na Santa Cruz, onde também havia reclamações.
Unidos, os vizinhos preparam um abaixo-assinado para enviar à Prefeitura, planejam atuar na esfera estadual e entrar na Justiça para barrar a mudança. Uma das razões é a proximidade da escola infantil Lápis Mágico, que atende crianças de três meses a seis anos. A diretora da escola, Mariuze Sutani de Danielli, revela preocupação até com o futuro da escola diante da insegurança dos pais. “Passa certa insegurança, não é preconceito”, apontou.
Há o temor dos vizinhos de que os adolescentes aproveitem a escuridão das ruas e a praça para causar problemas. “A gente está apavorado, porque a gente já convive com uma praça escura, cheio de usuário de drogas. São menores infratores. Ninguém pode negar isso. Está todo mundo morrendo de medo”, desabafou a moradora Maria Cristina Rodrigues de Lima Lopes. “A gente houve coisas horríveis dos vizinhos lá de baixo, que eles tumultuam”, completou.
Entre as preocupações estão o fato de grande parte dos moradores serem idosos, além da proximidade dos infratores com os filhos. “Eu tenho dois filhos que trabalham e voltam à noite e a gente fica preocupada a hora que chega, que sai”, colocou Sueli Cavenaghi. “Eu tenho um filho especial, vamos perder nossa liberdade. Vamos ter que viver trancados por causa dos bandidos”, reclamou Eva Rempel.
Os moradores se preocupam ainda com gastos extras com segurança, como colocação de cerca elétrica. “Nós ficamos preocupados. É semi-aberto, veja a situação”, aponta o morador Dairson Paes. “Que garantia o governo vai dar pra gente que a gente vai estar seguro”, questiona Cristina.
Sem participação
Diante de questionamentos de moradores por uma eventual participação da Prefeitura, o prefeito Gustavo Stupp garantiu não ter responsabilidade pela transferência e nem ter sido consultado. Stupp negou também que a Prefeitura participe do pagamento do aluguel, como foi especulado.
Casa poderia ficar até abril na Santa Cruz
A Fundação Casa informou em nota que a mudança de local da unidade de semiliberdade foi motivada pelo término do contrato do atual imóvel. A informação foi desmentida pela proprietária onde a casa funciona, Dirce Simoso Malvezzi, a Tia Dirce, e pela própria diretora da Fundação Casa, Érika Cristiane Diniz de Oliveira.
Tia Dirce e Érika informaram que o contrato terminaria em abril de 2017, mas a Fundação decidiu buscar um novo local. Tia Dirce diz ter sido informada que até o dia 30, a Fundação irá deixar a casa e ainda não tem informações sobre a rescisão do atual contrato. Já Erika coloca que a mudança será até outubro.
Erika explicou que há dois anos busca um imóvel mais adequado. A Fundação procurava um imóvel maior para atender melhor e apontou como outra vantagem um custo menor do novo local. Segundo a Fundação, a escolha se deu com base em pesquisa multidisciplinar. Os adolescentes ficarão mais próximos da rede de atendimento, como escolas, cursos de educação profissional, pontos de ônibus, do Poder Judiciário e da rodoviária, pois alguns viajam aos finais de semana, além de receberem famílias. “Eu tenho que ver o que é adequado para mim”, resumiu Érika.
Questionada se a mudança pode não se concretizar, Erika disse que a casa sairá da Santa Cruz de qualquer forma, mas admitiu que possa até ir para outro local caso haja algum entrave na transferência planejada.
Diretora defende direito de menores circularem
A diretora da unidade, Erika Oliveira, criticou o preconceito e lembrou que os adolescentes têm o direito de circular na sociedade e passam pouco tempo na casa. Erika frisou que os jovens tem a liberdade restrita, mas não estão proibidos de transitar: “Eles vão circular como qualquer cidadão”.
Cada adolescente tem um Plano Individual de Atendimento e cumpre uma agenda, deixando a unidade sempre acompanhado de um funcionário, até para lazer, indo sozinho apenas à escola. Em caso de voltarem a cometer um delito, acabam deixando a casa, regredindo para o sistema de internação. O descumprimento da medida gera um mandado de busca e apreensão. Mas Erika diz que o índice de descumprimento é baixo e há sucesso na inserção na sociedade.
A casa tem uma equipe com psicólogo e segurança, mas não é possível garantir que não haverá problemas. “Na rua não tem como ter domínio das ações, mas se ocorrer um furto ou outro, ele vai ser responsabilizado”, garantiu Erika, frisando que problemas são muito esporádicos.