Às vezes eu penso que a vida é ao contrário. O nosso corpo está mais preparado para a maternidade entre 20 e 35 anos, fase que ainda estamos alçando voos no mercado de trabalho e a estabilidade financeira (se é que ela existe) está em construção. Aí que começa o malabarismo físico, mas, principalmente, emocional.
Quando meus filhos eram pequenos eu me sentia uma fraude. Certa vez, em uma entrevista de emprego para a qual eu tinha todos os requisitos que a oportunidade requeria, uma voz latejava dentro de mim que certamente eu deixaria a empresa na mão. É que criança tem febre e acorda vomitando sem motivo aparente e, neste caso, precisaria de pelo menos algumas horas para colocar a situação no trilho.
Minha vontade era sair correndo dali e não envolver ninguém nesta loucura. Mas, como? Além de atenção, filhos precisam de coisas e elas custam dinheiro. Aparentemente, ou “Instagramente” falando, tem gente que consegue a fórmula mágica. Eu luto diariamente por ela há 17 anos, na certeza de que sempre estou devendo. Ou para os filhos ou para o trabalho.
Outro dia ouvi uma história perfeita: a pessoa tinha uma babá, trabalhava o dia todo feliz da vida e quando chegava em casa só se dedicava às crianças até elas dormirem, com direito a sentar no chão e banho demorado. Me senti péssima: sempre chego com fome e louca para tomar banho e esticar meu corpo na cama! “Troféu Joinha” para esta mãe e pontinhos negativos para mim.
Depois de ficar me comprando com o coração bem incomodado, pensando no quanto venho falhando pelo caminho, no meu íntimo, embora respeite demais o fato de que cada um é um, cheguei à conclusão que essa plenitude não faz sentido para mim. Numa análise mais profunda, mesmo que bem cuidados, sabemos que a ausência rouba de nós os primeiros passos, a primeira gargalhada, e tantas outras coisas.
O segundo ponto é que haja habilidade para transmutar o cérebro, que passa o dia numa tomada constante de decisões que o mercado nos exige, para um lado angelical que brinca com patinhos boiando na banheira. Sem falar na sincronicidade britânica desta relação matrimonial, também questionável com crianças pequenas em casa.
O foco aqui não é de maneira alguma desqualificar. É só dizer que eu não consigo, por mais que às vezes eu me esforce muito, nem chegar em casa todos os dias com sorriso no rosto, nem matar um dia de trabalho para escolher um vestido de 15 anos sem me autorresponsabilizar.
Faço isso porque acredito que toda vez que a gente tem coragem de dizer para o mundo quem somos e nos libertar deste peso, curamos quem está do lado. Precisamos nos lembrar que não deixamos de ser humanos depois que nos tornamos pais e que pode ser bem aí que esteja o pulo do gato.