Que tal o Arthur Lira ou Ciro Nogueira como primeiro-ministro? Brincadeira ou tem fundo de verdade. Que o leitor tire as conclusões. O fato é que o Brasil adota como sistema de governo um presidencialismo de tipo imperial. E com sustentação partidária. Sob a capa rota de uma coalizão, o governo padece de crises cíclicas. Tanto mais extensa a aliança em torno do Executivo, maior a probabilidade de seu comandante, o presidente, administrar sismos nas frentes congressuais para garantir a governabilidade. Agora, chegou, mais uma vez, a oportunidade para o centrão, com suas siglas amorfas, abocanhar fatias de poder.
O nosso presidencialismo sofre uma crise crônica. A relação de troca mede o equilíbrio entre o Executivo e o Legislativo. O primeiro alimenta-se da base política e esta come do seu pasto para engordar, reeleger seus representantes e se perpetuar no poder.
Um parlamentarismo à moda francesa ou portuguesa não parece combinar com os traços de nossa realidade política. Sua arquitetura é mais refinada. Seu escopo, mais plural. O modelo parlamentarista abriga uma coleção de adjetivos que emolduram a moderna política: avançado, racional, mais democrático, conectado à realidade, flexível, sensível à dinâmica social. Ocorre que na esfera dos costumes políticos estamos ainda no ciclo da carroça, do trem maria-fumaça, da construção das primeiras estacas éticas e morais. A semente presidencialista, como se sabe, viceja em todos os espaços.
Herdamos da monarquia portuguesa os ritos da Corte: admiração, bajulação, respeito e mesuras, incluindo o beija-mão. Já o parlamentarismo que vicejou na Europa se teria inspirado na ideologia liberal da Revolução Francesa, cujo alvo era a derrubada do soberano.
O poder que emana do presidencialismo impregna a figura do mandatário, elevado à condição de pai da Pátria, protetor, benemérito, imagem que ganhou tintas fortes no desenho de nossa cidadania. Por isso mesmo, o parlamentarismo não tem chance por aqui. Já imaginaram a figura de cacique do centrão como primeiro-ministro?
Não temos uma cultura política que abrigue o parlamentarismo. Sistema que carece de partidos fortes, com bandeiras programáticas claras, estatutos sólidos, como fidelidade partidária. Instituir o parlamentarismo sem moralização da vida política é pregar no deserto, é aumentar a dose de caos. Tivéssemos um sistema partidário forte, o sistema parlamentarista seria o ideal para reorganizar a trilha do país. Infelizmente, ainda não estamos maduros para ganhar este avanço.
* Por Gaudêncio Torquato: jornalista, escritor, professor titular da USP e consultor político.