É chover no molhado falar que a maternidade é cíclica. Os dias seguem numa certa normalidade até que, de repente, “pá”! Algum gatilho chama a atenção e você percebe que tivemos um grande salto, uma mudança de fase como na série da Netflix. Todas elas levam o nosso cérebro para o estado de alerta pela necessidade de compreensão e algumas provocam uma espécie de indigestão, daquelas como quando você come igual uma capivara raivosa.
Em casa estamos vivendo a transição da adolescência para a fase adulta. A impressão que tenho é de que, como não vejo mais um corpo infantil, não preciso me empenhar tanto em proteção e posso, ao invés de ser a provedora mor, ter coleguinhas para dividir as responsabilidades da vida.
Tem dias que tenho muita, mas muita, mas muita bronca em ter que transportar a galera de um lado a outro, seja porque tinha planejado fazer outra coisa ou, simplesmente, por birra mesmo. Enquanto faço contrariada, observo aqueles “bitelos” sentados no banco ao lado e, ao mesmo tempo em que tenho vontade de fazer um discurso enorme, daqueles bem chatos, por outro, lembro que ainda não possuem licença para dirigir, que acho longe para ir a pé, caro para ir de Uber e não preparados por mim para ônibus.
O mesmo vale para as coisas de casa. Se eu peço, acontece, se não… não. A questão é que sempre foi assim e, só porque os vejo maiores, acabo na esperança de que tudo mudou. Já ouviu falar que “crie unicórnios, mas não crie expectativas”? É isso. Imagino que como estão de férias em casa, assim como eu, vão percorrer todos os cômodos vendo a necessidade de cada, para só depois de tudo feito agarrar no celular e ir para Marte.
Tem ainda a janta, aquela que, independentemente se vou comer ou não, se chego cedo ou tarde, tem que ter dedo meu. Pode ser só para ser a voz do “o que vamos pedir” ou a que chama depois que tudo já está pronto e a mesa colocada.
Olha, eu amo sem limites e por isso não vejo problema em dizer que muitas vezes levo tempo para conviver confortavelmente com as mudanças de fase. Às vezes preciso ficar longe – nem que seja no quarto com o fone de ouvido – buscando a solidão e o silêncio interno. Pode até parecer cruel, mas, literalmente, fujo do desconforto, até que crie mecanismos para viver aquela situação.
E funciona porque, quando vou lá nas profundezas buscar a razão, começo a percorrer quem fomos até chegar aqui, como se estivesse num livro de história, costurando os personagens e suas características. Então encontro a base, a estrutura de que são feitos e pronto, fico aliviada porque essa me emociona, orgulha.
Não canso de dizer que não nascemos prontos. Assim como as situações são novas para os nossos filhos, são também para nós, como pais. Na maior parte das vezes, também nunca estivemos naquele lugar e precisamos primeiro tatear, para só depois ver claramente.
Por Bárbara Andrade
Empresária, formada em Jornalismo, pós-graduanda em Psicologia e Coach, foi vice-presidente da Associação Civil Sanquim até 2019 e professora voluntária de Redação. [email protected]