sábado, novembro 23, 2024
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Não somos farinha do mesmo saco

Eu fui professora de redação por cinco anos num cursinho pré-vestibular que atendia basicamente alunos de escola pública e bolsistas de particular. Infelizmente, ensinar escrever não é valorizado e, bem diferente do que acontece no ambiente privado, com aulas semanais de produção de texto, na maior parte das vezes, no estado e município, elas ocorrem para tapar buraco. Uma espécie de “pega esse tema e faz aí”.

Quando entrava na sala, nos primeiros dias, me sentia uma ET. O olhar arregalado era distante e ansioso, como se dissessem que aquilo não era para eles, uma espécie de “sério mesmo que você acha que vamos gastar tempo com isso?”. Foi então que entendi que antes de qualquer tese, teria que construir relacionamento e autoconfiança.

Basicamente existe uma fórmula na dissertação que, assim como na matemática, é questão de ir completando os espaços para chegar no resultado. Só isso. É claro que quanto mais conteúdo de vida, melhor. E aí está outro ponto fundamental!

Já pararam para pensar que temos que escolher a profissão quando não somos economicamente ativos? Cá entre nós, claro que existem exceções, mas quantos, aos 18 anos, curtem ou pelo menos entendem o português de Machado de Assis em Dom Casmurro? Honestamente, hoje acho interessantíssimo acessar os clássicos da nossa língua, mas na fase de vestibular o que mais queria era que chegasse o final de semana.

Desta forma, o meu conselho sempre foi pelo básico. Está passando na sala e ouviu uma notícia? Para, presta atenção, pensa sobre ela. Faz o mesmo rolando o feed do Instagram ou com aquele texto que recebeu no Whats e reflete: faz sentido? Por que? Usa o que vê da vida para relacionar o que acontece e construir a própria base de argumentos.

Em quantos pontos da vida tentamos fazer o que todo mundo faz achando que o resultado será o mesmo? Eu vivi o tão sonhado acampamento NR no final do ano, um lugar lindo, cheio de atividades, cheio de gente jovem de vários lugares do Brasil que me fez ter ainda mais convicção: além de olharmos para o complexo bem antes de sermos íntimos do básico, nem tudo é para todo mundo.

Teve quem preferiu não sair do quarto. Teve quem trocou de escola porque não se relacionava bem com os da sua. Nitidamente tinha quem se sentiria mais feliz em frente ao computador. Eu vivi isso na minha casa. A Gabi ganhou um livro da vó e bastava saber que iríamos na casa dela ou que ela viria passar uns dias na nossa que pronto, estava lá o exemplar rolando de um lado para outro. Isso aconteceu por anos, até um dia que tivemos uma conversa franca.

Para o entendimento da minha sogra, alguém “aculturado” é somente alguém que lê. Claro que é de fato importante, que enriquece o repertório, a criatividade, as emoções, mas não é o único. Até porque pessoas aprendem de formas diferentes e certamente uma pessoa que é auditiva reterá mais informações assistindo um bom vídeo que lendo. Saber sobre isso deveria ser o primeiro passo. Autoconhecimento é a base da autoconfiança e não, não somos todos farinha do mesmo saco.

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