Abusando do direito que me deram de mal usar este espaço, vou gastar umas linhas com o futebol. Do futebol que se engana a si mesmo, que pensa que é mas não é, que finge que é sério e que os que se envolvem com ele fingem que estão fazendo a gestão de alguma coisa séria.
A bola do ano é o Cruzeiro. Saudado e consagrado como a maravilha brasileira. É o campeão do Brasileirão (o brasileiro gosta de superlativos, não é mesmo?). Mas, quem apostará na sua perenidade? É o grande da ocasião. Tudo que fez em 2014 deu certo. O que não assegura que seja o grande modelo para os confrades e nem que repetirá semelhante desempenho em 2015.
No futebol do Brasil, é tudo tênue. Quando não ocasional e passageiro. O Atlético Mineiro, campeão da Copa do Brasil em jornadas épicas, até outro dia estava disputando a segunda divisão do Brasileiro. O que garante que não voltará ao degrau de baixo, em vias de onde está para ir o Palmeiras, o “alviverde imponente”.
O São Paulo, imponentemente arrogante, rondou a degola no ano passado. Recuperou-se parcialmente este ano, tecnicamente. Mas, sob o ponto administrativo, é um clube quebrado, pendurado nas arcas da Rede Globo e de bancos. “Entre os grandes, és o primeiro”. Hinos são feitos para louvar, mas que em colisão com o real.
Até aqui – e acho que não é preciso ir muito além – está um resumo da falsidade que é o futebol brasileiro, temerariamente querendo imitar a Europa, ignorando que é aquele primo pobre do inesquecível quadro humorístico criado por Chico Anysio.
O grande futebol tem casos assim. Um clube que se anuncia à venda e um atleta que não recebe direito de imagem em seu clube há 20 meses. É também aquele que usufrui de estádios construídos com dinheiro (em parte ao menos) da viúva. Tem também estádio construído porque um então presidente da República queria-porque-queria que seu clube tivesse um para sediar jogos do Mundial.
Não. Não quero escrachar, esculachar, debochar. Apenas é assim como vejo o que está acontecendo de anos (ou décadas) para cá, a partir de quando os clubes começaram a brincar de fazer futebol. Porque contratar treinador a R$ 700 mil por mês e jogador por R$ 1 milhão por mês é mais do que insensatez. É irresponsabilidade.
Nestas alturas, tenho que inventar um neologismo: o que temos são ‘futebóis’. Porque abaixo da linha do Equador do esporte bretão, em que estão os clubes que disputam os regionais de primeira, segunda, terceira e intermináveis divisões, o clima é de terra arrasada. Nessa faixa dos futebóis, o calendário é de ano de três meses, quatro meses e olha lá.
Mas, alguém ganha dinheiro ao rolar da bola? Claro. Um aqui, outro ali, alguns craques, alguns finados craques (como Valdivia), empresários espertos (se me entendem) e certamente dirigentes sem escrúpulos. O certo mesmo é o seguinte: quem mais ganha dinheiro no futebol brasileiro é a Rede Globo de Televisão. Hegemoniza e escraviza. Paga o que quer aos clubes e cobra o quer das Coca-Colas e Brahmas.
Paradoxo: se não fosse o dinheiro da Globo, alguns ilustres e históricos brasões de clubes brasileiros estariam hoje a sete palmos do chão.
Valter Abrucez é jornalista autodidata. Ocupa, atualmente, o cargo de Secretário de Comunicação Social na Prefeitura de Mogi Guaçu e escreve aos sábados em O POPULAR.