Em 1958, logo após brilhar na Suécia, o itapirense Hideraldo Luiz Bellini fez escala em Mogi Mirim antes de retornar à cidade natal. Na parada, foi homenageado pelos desportistas mogimirianos, sendo agraciado com um relógio em forma de bola durante cerimônia que mobilizou inúmeras pessoas, encantadas com a presença do capitão da seleção de futebol na Copa do Mundo.
Um dos maiores nomes do esporte regional, Bellini morreu em março de 2014. Em Itapira, em partida do Mogi Mirim, se respeitou um minuto de silêncio pelo ídolo. São histórias que se entrelaçam, mas não mais do que o próprio ex-jogador poderia imaginar em relação ao corpo dele e o futuro da ciência esportiva.
Após a sua morte, o cérebro foi doado pela família para estudos a respeito do Mal de Alzheimer, doença que o acompanhou por quase 20 anos. O objetivo dos cientistas? Avaliar uma relação entre a doença e o futebol. As análises acerca do cérebro de Bellini foram publicadas em 2016 pela National Library of Medicine, sob o título “Chronic traumatic encephalopathy presenting as Alzheimer’s dementia in a retired soccer player”, em um estudo liderado pelo Prof. Dr. Ricardo Nitrini, da Universidade de São Paulo (USP).
Na época, foi descoberto que Bellini não teve apenas a Doença de Alzheimer, tida como causa de sua morte, e sim a Encefalopatia Traumática Crônica (ETC), em um grau maior. A doença, conhecida popularmente como “demência do pugilista”, é incurável, degenerativa e causada por repetidos traumas na cabeça, como pancadas, socos… ou cabeceios.
Existe uma crescente preocupação entre órgãos importantes do futebol mundial com as consequências neurológicas de cabecear uma bola de forma repetitiva, algo comum no esporte. Isto fez com que, no último mês, a International Football Association Board (IFAB), responsável pelas regras do esporte, passasse a proibir que jogadores menores de 12 anos pratiquem o cabeceio. A nova regra teve a adesão da Federação Inglesa em suas categorias de base, e a CBF também monitora uma possível mudança.
Mas esta iniciativa não saiu de qualquer lugar. De acordo com reportagem publicada recentemente pelo site UOL, o estudo sobre o cérebro de Bellini foi uma das fontes utilizadas pela junta médica da IFAB para definir esta mudança de regra. De acordo com os neurologistas, o ponto central é a repetição. Algo que incide em boxeadores, como já citado. Grandes nomes do pugilismo, como o brasileiro Eder Jofre, sofreram com problemas no cérebro no final da vida. Atletas de rúgbi e futebol americano também estão mais sujeitos às doenças neurológicas.
E a pesquisa baseada no cérebro de um itapirense, que por diversas vezes esteve aqui em Mogi Mirim, é o alicerce para que a ciência avance na prevenção a estes problemas. Se em vida Bellini foi responsável por eternizar o gesto de um capitão erguer o troféu sobre a cabeça ao celebrar um título, após a morte o ex-jogador também pode contribuir para um marco global.
CRÉDITO DA FOTO: Acervo UH/Folhapress