Lá em casa estamos vivendo a fase dos vestibulares. A emoção da Gabi está tão flutuante quanto a Kingda Ka, a maior montanha-russa do mundo, localizada em Nova Jersey. É normal, mas não deveria ser. Primeiro porque é desumano demais você ter que escolher o que “ser” pelo resto da sua vida aos 18 anos. Segundo, e pior, é usar tudo isso como medida de sucesso.
Como escolher a ferramenta que usarei para produzir dinheiro sendo que, tão jovem, conheço tudo de forma tão superficial? Como compreender o quanto vou precisar em montante para ter a vida material que almejo sendo que não sou economicamente ativo? E digo mais, quantas pessoas você conhece que conseguem manter o foco em química, física, literatura enquanto os hormônios fervilham por baladas e amigos?
É “contra biológico”, se é que essa expressão existe! Beira a crueldade mensurar a capacidade humana numa prova que exige conteúdos que, em grande parte, nunca mais farão parte de nossos dias. São quatro horas para demonstrar três anos de aprendizado. Fez tudo certo neste tempo todo, mas acordou passando mal no dia D? Não importa: só vale o resultado.
Em casa tenho dois perfis muito diferentes. A Gabi é “mega caxias”. Encerra o bimestre com sobra de notas, sempre. Mesmo já tendo o suficiente, se houver a oportunidade de um ponto extra, lá está ela. Já o Neto é do feijão com arroz. Faz o que precisa, quando precisa e só!
Me importo com isso? Não! E, por mais contraditório que pareça, já que são posturas completamente diferentes, minha preocupação com os dois é a mesma: fazê-los entender que estudar representa apenas uma parte. Se não for aprovado no vestibular, você ainda é quem é!
Além do mais, foi-se o tempo que ensino superior completo era igual a dinheiro no bolso. A verdade é que faculdade fala de teoria, mas não ensina a trabalhar. Você ganha conhecimento técnico, mas se não meter as caras em estágio logo de início, corre a chance de se afastar cada vez mais do mercado do trabalho porque simplesmente não sabe por onde começar a aplicar tudo aquilo.
Se o parâmetro for sucesso, faz menos sentido ainda afunilar as coisas. Lembram quando o corredor Vanderlei Cordeiro de Lima foi abraçado por um torcedor e por conta disso deixou de ganhar a medalha de ouro? Alguém tem dúvida de que ele estava preparado? Que se dedicou?
Que treinou o quanto precisava? Ele pode não ter sido o primeiro a chegar, mas a forma como reagiu segue sendo um exemplo de conduta até hoje. Alguém é capaz de dizer que ele não teve sucesso naquele dia só porque não ficou com o primeiro lugar?
A vida não é linear, mas às vezes nos cobram como se tudo fosse questão de vida ou morte. Esqueceu de fechar o capacete? Repetiu o exame para habilitação de moto! Mas gente, na vida real, não é só fechar e seguir? Porque isso então?