Lançada pelo governo federal, a Medida Provisória do Programa Mais Médicos representa grave risco à assistência à saúde da população, além de piorar a qualidade dos cursos de medicina. Gerou protestos dos médicos que foram às ruas em todos os Estados. Mais de 500 emendas foram apresentadas à MP por deputados e senadores, enquanto o STF aguarda esclarecimentos da Presidência da República.
Fora as mobilizações e ações judiciais movidas pelas entidades médicas, – conselhos, sindicatos e associações, renomadas instituições que mantém cursos de medicina também posicionaram-se contrárias às medidas. A exemplo da USP, Unifesp e Unicamp.
Ao invés de ouvir argumentos lúcidos de pessoas e entidades comprometidas com a saúde da população e do ensino médico no país, o governo insiste em propostas unilaterais, temperadas com o discurso maniqueísta de que os médicos brasileiros e suas entidades são os responsáveis pelas dificuldades de acesso ao SUS.
O Programa Mais Médicos não se sustenta porque foi idealizado como uma estratégia de marketing eleitoral, concebido não como uma política de saúde, mas como uma resposta às ruas e à queda de popularidade do governo.
Por certo são inadiáveis medidas para solucionar um problema real que aflige tantos brasileiros, a dificuldade de contratação de médicos no SUS em pequenos municípios e nas periferias das grandes cidades.
Mas feito às pressas, sem nenhum debate prévio, o programa contém propostas demagógicas que não surtirão o efeito anunciado, seja porque são tecnicamente inviáveis ou inconstitucionais.
Não podemos concordar com a forma ilegal de vinculação precária proposta, por meio de bolsa sem direitos trabalhistas, como 13º salário, FGTS e horas extras.
Somos receptivos à vinda de médicos formados no exterior, mas o Brasil não pode abrir mão da revalidação de diplomas, única maneira de proteger a população de profissionais mal formados.
A propósito, o Cremesp, que realiza há oito anos exame de recém-formados, defende uma avaliação também aos brasileiros aqui graduados, cuja aprovação seja condicionante à obtenção do registro de médico.
Terão o nosso apoio medidas que aproximem o ensino médico das necessidades do SUS, o que pode ser feito após discussão com a área acadêmica, sem necessidade de aumentar o curso em mais 2 anos, sem serviço civil obrigatório e, ao mesmo tempo, assegurando uma vaga de residência médica para cada recém-formado.
A mais irresponsável das medidas, porém, é o anúncio da abertura, sem condições, de mais de 11 mil vagas de graduação até 2017. Boa parte dos cursos, inclusive de algumas universidades federais, não tem corpo docente suficiente e nem hospital de ensino.
A garantia de acesso à assistência médica de qualidade, universal e integral, sempre foi preocupação dos médicos. Esta meta nunca foi alcançada, principalmente pela falta de financiamento adequado e de um gerenciamento eficaz do sistema.
Afirmar que o problema principal do SUS é a falta de médicos é um reducionismo de quem não tem capacidade de encontrar soluções para os reais problemas do setor.
Há muito tempo os médicos têm apresentado ao governo federal propostas de soluções sendo a principal delas a aplicação de 10% da receita bruta da união para a saúde, além da criação da Carreira de Estado, com ingresso por concurso, dedicação exclusiva e remuneração compatível com o seu tempo de formação e responsabilidade.
Reafirmamos, por fim, que nós, médicos brasileiros, estamos dispostos a contribuir com o melhor da nossa capacidade para a Saúde Pública, porém não iremos compactuar com propostas demagógicas, inexequíveis e que não irão solucionar os graves problemas do SUS, conquista maior da sociedade brasileira.
Florisval Meinão e Renato Azevedo Júnior são presidentes da Associação Paulista de Medicina e do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo