sábado, novembro 23, 2024
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O teatro eleitoral

Por Gaudêncio Torquato*

A viabilidade de um protagonista da política é um processo que abrange um conjunto de variáveis: o discurso, a história, as condições em que se desenvolve a cena política, a economia, acidentes e incidentes envolvendo os atores, os dramas, angústias e expectativas das populações, os apoios e desapoios e, sobretudo, a esperança por ele encarnada.

Por isso mesmo, os cenários projetados para o amanhã são bastante nebulosos, mesmo se eventos planejados estiverem de acordo com a liturgia da política em tempos eleitorais. É tarefa das mais espinhosas prever o sucesso ou o insucesso de candidatos, ainda mais quando se vive em um país que oscila na gangorra, subindo e descendo, andando de lado como caranguejo. E, para obscurecer mais ainda a visão, o Senhor Imponderável costuma nos fazer visitas surpreendentes, entornando o caldo de uns, esquentando a água fria de outros, tornando possível o que se dava como impossível.

Vejamos o estado da economia. A opinião unânime de economistas e consultores é que a inflação logo, logo, baterá nos dois dígitos, prevendo-se um refluxo das atividades produtivas e até com viabilidade de uma recessão. Quem sofrerá mais nessa paisagem de desolação? Os mais carentes, que sentirão o peso da inflação nos alimentos, na vida cotidiana. As massas da base da pirâmide serão as mais castigadas.

E o que dirão os protagonistas: os da oposição, como a senadora Simone Tebet, que acaba de se lançar candidata à presidência da República, Ciro Gomes, Sérgio Moro, Lula, entre outros, dirão que o culpado é o presidente Jair. Os setores médios saberão distinguir a linha tênue que separa a mentira da verdade, mas as massas poderão até esquecer de quem será a culpa se sobrar uma graninha para comprar comida. Basta serem recompensadas pelo auxílio-Brasil.

O fato é que os protagonistas usarão suas habilidades para que os discursos sejam mais aceitáveis que as promessas dos adversários. Alguns estarão relendo os preceitos de Maquiavel ou relendo o Breviário dos Políticos, do cardeal Mazarino, com sua sequência de sentenças anárquicas: “Simula & Dissimula”.

A manipulação chegará aos píncaros. Ex-condenados falarão de sua inocência e da forma torpe como foram condenados. Um candidato, apontado como culpado pelo caos reinante no país, será endeusado por simpatizantes por representar o Santo Guerreiro contra o dragão da maldade. O grupo da terceira via pregará a união dos brasileiros contra a radicalização dos polos extremos.

Quem levará a melhor nessa contenda? Aquele que melhor puder administrar a máxima de Ortega y Gasset: “O homem é o homem e a sua circunstância”.

*Gaudêncio Torquato
é jornalista, escritor,
professor titular da USP
e consultor político

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