No fundo, bem lá no fundo, não gosto de “Dia D”. Talvez isso aconteça por eu não ser muito boa em lidar com expectativas e com coisas que fogem ao meu controle, como o comportamento dos outros, por exemplo. Mas já que pertenço a um grupo e não sou nenhuma extremista, participo de bom grado, faço questão de preparar pratos afetivos e gasto muito tempo percebendo e sentindo a vida.
Tendo em vista o quão recente é a perda da minha vó e uma crise alérgica que exigiu silêncio para não coçar a garganta e tossir ainda mais, observar foi o que mais me coube. Notar o quanto a vida passa, o quanto, ainda que sendo nós mesmos, vamos trocando de papel no decorrer do tempo, uma espécie de dança das cadeiras, é um lado artístico de ser um e viver vários personagens.
Lembro nitidamente quando criança do que era acordar no dia 24 de dezembro e ficar esperando pelo Papai Noel. E pelo presente, claro. Também lembro de achar tudo aquilo estranho: como poderiam haver tantos para dar conta do mundo todo, mas também nunca conseguia descobrir quem estava por trás daquela roupa. Talvez esteja ligado à tal da magia.
Da criança, passei a adolescente que achava que as comemorações na casa de todo mundo eram bem mais animadas que na minha. Por alguns anos foi assim: emprestava a família dos outros no Natal e passava a noite perambulando pela madrugada de Ano Novo, em busca de um esplendor que nunca encontrei.
Aí comecei a namorar, casei, vieram os filhos e adivinham: o dia 24 voltou a ter Papai Noel. Foi assim até que, faz uns dois anos, a galera começou a achar que estar com a família era bem sem graça. E a pandemia foi muito boa nisso, deu um tempo para que, como pais, fossemos compreendendo e absorvendo que estava na hora de mudança.
O bom é que, ao mesmo tempo que cíclica, a vida é fabulosa. É como se estivéssemos no mesmo lugar pela segunda vez e isso traz a segurança da maturidade: temos referências de como as coisas devem acontecer, um alívio para ansiosos como eu. É também uma ponte que nos ajuda a nos mantermos próximos dos nossos filhos, entender suas aspirações e compreender suas mancadas. Estivemos ali não faz muito tempo!
Só sei que este ano, além de fazer parte das adultas – que estão ficando as tias velhas – responsáveis por parte da comida e pelo pavê de pêssego, fui promovida a sogra. Nosso carro agora está com 100% de lotação e eu e o Alisson rejuvenescemos alguns anos passando o dia ao lado de três almas jovens.
Poderíamos nos apavorar com as possibilidades de um namoro adolescente, mas como essa estrada foi linda para nós, sorrimos com a leveza de quem colheu flores pelo caminho. Não sei traduzir em palavras, mas estamos apaixonados pela paixão deles.
Por Bárbara Andrade
Empresária, formada em Jornalismo, pós-graduanda em Psicologia e Coach, foi vice-presidente da Associação Civil Sanquim até 2019 e professora voluntária de Redação. [email protected]