Depois dos filhos, sinto como se estivesse em uma eterna gincana. Aquelas que hora tem que atravessar a lama, hora escalar a corda e descer pelo outro lado e pular com os joelhos bem elevados. É diariamente preciso olhar o que me espera, traçar estratégias e estar preparada para ter forças quando o cansaço bater.
Tem dias que dá tudo certo. Em outros, derrubo todas as cancelas, tropeço, cato cavaco e fico só com o nariz de fora no barro. E acredite, escrevo isso rindo, não com pesar. Já vivemos muita trapalhada que renderam boas memórias, como viajar e deixar a casa inteirinha reganhada.
Penso que isso acontece pois, por sobrevivência, acabamos tendo foco seletivo, se é que isso não é redundância, para que a vida possa seguir. Neste caso, a energia estava voltada a colocar tudo no porta-malas e a galera entrar no carro. A gente só percebeu quando voltou e ainda assustou com a porta da sala aberta, achando que tínhamos sido assaltados.
Pior que isso é esquecer do filho. Nós (vou falar na terceira pessoa para não difamar os que amo rsrsrs) já deixamos o Neto no clube até quase fechar. Ele deveria ter uns dez anos e, desacreditado do que estava passando, na certeza que isso nunca aconteceria rsrsrs, ficou sentado esperando, não teve reação em ligar.
Neste ponto a Gabi leva muita vantagem. Como é ligada e desconfiada da nossa capacidade em educar filhos, não conta com o acaso não. Até hoje, com 18 anos, liga todooooooooosssss os dias quando a aula acaba e ou se está em algum lugar que precise que vá buscá-la, mesmo que seja rotineiro.
Ela também se saiu melhor na escola. Sabe aquele lance de “uma caixa de fósforo para a atividade de amanhã?” Então, o Neto nunca levou! Como sempre pediam coisas diferentes por estarem em séries diferentes e a Gabi repetia sem parar o que precisava, quando eu providenciava, meu cérebro dava como tarefa completa.
Tenho trauma disso! Cada vez que o menino entrava no carro com um rolinho de papel higiênico decorado na mão, eu sabia que tinha ganhado um ponto negativo na função maternidade… Eu soltava um “Neto, a mamãe esqueceu!” e ele respondia que o amiguinho tinha levado dois e a professora dividiu. Só gratidão por essas pessoas rsrsrs!
E a escola me rendeu muito mais vergonhas. Já fui em reunião de pais na data errada, já liguei depois de anos e não sabia o horário de saída porque sempre busquei depois das 18h e a própria dona atendeu e já deixei a criança dormir anos sem travesseiro porque não estava na lista de materiais.
Esse foi o preço pago por ter tido uma família jovem, sem rede de apoio e sem dinheiro. Mas foi tão positivo. Hoje a Gabi e o Neto são superdescolados, se adaptam ao que precisam e não fazem distinção de pessoas. Mais que isso, aprenderam que ainda que sobre amor, as pessoas estão em constante construção e que sempre é possível escolher em que pote armazenar as memórias. No da dor ou no da alegria.