Em tempos de extrema intolerância, o sentimento de compaixão em relação ao próximo parece ter desaparecido do mapa. Diante de tanta individualidade e da insensatez dos homens, fica difícil acreditar que dias melhores em comunidade virão. Quando a sociedade começa humanizar coisas e objetificar pessoas é porque algo vai muito mal. Um sinal de alerta foi aceso. Atualmente, essa inversão de valores tem sido cada vez mais comum, em qualquer canto do mundo.
Aqui mesmo, em Mogi Mirim, a condição das pessoas em situação de rua tem gerado um impasse entre o Poder Público e a população, principalmente aquela parcela mais conservadora. É uma hipocrisia dizer que se entende a necessidade do acolhimento quando, na prática, o oposto é executado, tentando “jogar” essas pessoas o mais longe possível dos centros urbanos, ou seja, dos espaços públicos das cidades, que também são delas por direito.
Recentemente, um abaixo-assinado vem sendo feito pela vizinhança da Ladeira São Benedito contra a mudança dos moradores de rua para o imóvel da antiga sede da Guarda Mirim, localizada na mesma via. O serviço vinha sendo prestado no Centro de Referência em Assistência Social (Creas), que fica na esquina entre a Paróquia São Benedito e Santa Casa de Misericórdia. Contudo, após reclamações de que essas pessoas vinham causando incômodo na área da Praça Duque de Caixas, a mudança foi anunciada pela secretária de Assistência Social, Leila Iazzetta, no começo do mês.
Muitos até adorariam que esse pessoal fosse, como nos filmes de ficção, abduzido por outros seres. Deixando a ficção para o cinema, o problema é de todos, sim, e precisa ser enfrentado com uma boa dose de humanidade. Não fazer vistas grossas à realidade alheia talvez não seja o caminho mais fácil, no entanto, já é um bom começo para a construção de um ambiente mais solidário. As pessoas podem mudar de residência, carro, emprego, os objetos da casa, mas não têm o direito de definir, ou impor, onde as outras devem ficar. Ser livre significa ter o direto de ir e vir, querer estar ou sair das ruas, aceitar ou não ajuda.
A sociedade deveria, na verdade, fazer um abaixo-assinado contra políticos corruptos, os especialistas em roubar, além de dinheiro público, a dignidade dos cidadãos. Se há pessoas morando nas ruas, mesmo que por opção, é também porque o sistema é falho. Não cabe julgá-las por isso, uma vez que todas têm sentimentos, família e uma história de vida. A única certeza é de que a humanidade anda em terras bem distantes daqui.