São 20 anos de diferença entre eu e a Gabi e o Neto, bem pouco se o parâmetro for o quanto a rotina básica de uma criança mudou. Diria que se voltarmos nosso olhar para quem nasce na capital, não há grau de comparação, pode ser que a linha não se cruze em um único ponto que seja.
A criança precisa brincar, mas é mais significativo que ela seja bilíngue. Se antes “os assuntos não eram de criança”, hoje eles giram todinho em torno de pequenos reis que não consomem açúcar antes dos dois anos e vão para a escolinha de futebol com o dever de ser um novo Messi. E é claro que formar super-humanos custa muita vida…haja equilíbrio.
Há duas décadas praticamente não havia oscilação: a gente levantava da cama já sabendo como ia ser até dormir de novo. Tomava café da manhã, assistia televisão até na hora de se preparar para ir para a escola, voltava para casa, janta, banho e novela até a hora de dormir. Ah, com sopa no frio.
Eram poucas crianças que faziam atividades extras e as que o faziam era uma coisa ou outra, tipo ballet ou inglês, nada comparado com a agenda de hoje. É engraçado lembrar e me sinto como tendo vivido a Era Paleolítica. Só se tomava refrigerante aos domingos e, normalmente, havia um caminhão cheio deles que parava de porta em porta. Função parecida tinha os carros, eram usados só para ir na casa da vó, no resto da semana andava a pé ou de circular.
Hoje a vida fica extremamente improdutiva se não for sobre rodas, pode até ser do Uber, porque quem não é usuário constante não faz a menor ideia de horário e itinerário de ônibus. E é com nossos automóveis que paramos quase que diariamente no supermercado e ficamos “tête-à-tête” com aquelas infinitas garrafas pet de litros e litros de bebidas açucaradas.
Já pararam para refletir como somos testados o tempo todo hoje? Porque se antes o refrigerante era do sábado, a preocupação dele também. Hoje não, hoje ela está na pauta cada vez que estamos frente a frente com um deles que é quase que diariamente. E isso é ainda mais abrangente que parece: a oferta e acesso a comida são infinitamente maiores que a nossa necessidade de comer. Portanto, numa entradinha básica, além de lidar com o lado econômico, as vozinhas ficam pulsando entre comprar ou não, comer ou não, acumular na dispensa ou ter só para o momento. É coisa de maluco.
O mesmo acontece com a família. Lembram que o telefone era comprado e só “ricos” os tinham? Então, saber da vida dos outros era na mesma proporção da Coca Cola: malemá aos domingos. Agora tudo está a um clique! Se tiver grupo da família então, SENHORRRRR!
Não é à toa que nossas emoções andam cada vez mais afloradas. Talvez eu ache essa pressão com as crianças desnecessária por ter crescido de outra maneira, talvez essa nova geração lançada aos estímulos intensos desde que está na barriga passe por ela com mais naturalidade. Talvez, porque na base, na nossa concepção, nós somos bichinhos, somos animais e vocês já perceberam como eles se comportam?