terça-feira, novembro 19, 2024
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Quem quer pão?

 

Quando eu era pequena, lá em Barbacena, embora pense não ser um passado distante, a criação de um filho era muito diferente. Essa mudança toda acontece não só pelo avanço das coisas materiais, como fórmulas que reproduzem fielmente o leite materno e a fralda descartável, mas também porque os pais possuem mais acesso a informações técnicas.
Uma geração antes, na da minha mãe, os filhos se criavam. Os mais velhos iam dando conta dos mais novos, todo mundo solto no quintal e vida que segue. A comida era o que tinha: o leite que tinha, a mistura que tinha, é claro, quando tinha.
Na minha, grandes avanços: engrossavam o leite com “Maisena” para sustentar por mais tempo. Minha vó contava com orgulho que me davam uma mamadeira e assim que eu arrotava já mandavam mais uma. “Com três meses você já pesava nove quilos”, comemorava. O resultado disso é que até hoje o meu padrão de saciedade é o “quase vomitando”.
Melhorei com meus filhos, comem até o limite da fome. Só pegava um pouquinho no pé da Gabi o dia que tinha treino a tarde toda e colocava uma mísera colher de arroz no prato. E só o fazia porque a hora que ia buscá-la saía como se tivesse morrendo, porque reclamava de dor de cabeça e sensação de desmaio, no fundo aquele diagnóstico que o adolescente adora contar que teve rsrs.
Tivemos mais uma internação da minha mãe nestes últimos dias. Já está bem e em casa, ufa! Mas conversando com a outra acompanhante de quarto, ela exibia com o peito estufado o fato da filha de três anos nunca ter comido açúcar e não ter acesso a telas, nem televisão e nem celular, postura comum dos pais de hoje e que há tempos é uma pulguinha aqui na minha orelha. Ao mesmo tempo, fazer pães e bolos é um elo entre ela e a mãe que estava acamada.
Honestamente não tenho respostas. Primeiro porque fui construída com tudo que contei, o que, resumindo, quer dizer que é a realidade pela qual sou constituída, são meus padrões referenciais e eles é que direcionam nossas crenças. Além do mais, como não estou nesta fase, não parei para me debruçar e buscar a lógica disso tudo.
Dito isto, o que intriga este coraçãozinho é o resultado que esta geração de pais procura alcançar. Será que buscamos ter humanos mais puros? É uma questão de saúde ou será que pensamos, desta forma, formar pessoas mais aptas à concorrência frenética do capitalismo? Nossos filhos serão sempre os primeiros!
Não sou a favor do uso descontinuado de telas, aliás, ainda luto por isso aqui em casa. Mas, verdade seja dita, tudo bem ter um dia de preguiça, um dia em que a gente quer mais é ficar com o corpo jogado enquanto o cérebro se entope de coisas banais. O mesmo acontece com o açúcar. É evidente que ele precisa ser escasso, ser exceção, mas longe de ser veneno.
Uma certeza eu tenho: mais nocivo que tudo isso é ter referências que só vieram de teorias e não de relações bem estabelecidas. Estar à mesa com os nossos une e falar sobre coisas sem sentido alivia a alma. E se tudo isso for regado a bolo e pão quente, melhor ainda.

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