As instruções do Tiro de Guerra até 1969 eram ministradas, diariamente, durante todo o ano. Exercícios de táticas militares, marchas de curta, média e longa distância, técnicas de tiro e manuseio de armamento, além de palestras para a formação dos jovens nas áreas cívico-militar e social, eram as atividades, entremeadas com um pouco de esportes. E, obviamente, aconteciam situações inusitadas, como um roubo à sede, onde o(s) ladrão(ões) levou(aram) sete fuzis alemães, da marca Mauser, adquiridos pelo Exército brasileiro, em 1902. Essa ocorrência foi vivida “na carne”, pelo jornalista e atirador Mauro de Campos Adorno Filho, o Maurinho Adorno. Ele conta: “Era uma noite na semana do bicentenário de Mogi Mirim. Eu e mais seis companheiros fomos escalados para fazer a guarda noturna da sede, depois de termos passado a noite anterior em claro, fazendo a guarda ao ‘Altar da Pátria’, na Praça Rui Barbosa. Estávamos cansados e sonolentos. Como cabo, fiz a escala dos atiradores que deveriam ficar como sentinelas à frente do prédio. Dois deles, a serem rendidos (trocados) a cada duas horas. Fomos ao alojamento descansar nos beliches, numa noite calma, propícia ao sono. Durante o segundo turno, das 20h às 22h, um atirador pulou do beliche, gritando: ‘tem gente aí’. Imediatamente, eu e os seis atiradores – os dois sentinelas abandonaram seus postos e estavam dormindo no alojamento – corremos para o armário das armas: estava vazio! No gramado da sede, um capacete jogado. Havíamos sido roubados. Um atirador disse que havia escutado o ronco de uma Kombi, veículo semelhante ao do sargento Eudes Vieira. Liguei para o cabo Peccini, Luiz Afonso Peccini, e pedi que fosse até a casa do sargento comunicar-lhe a ocorrência. Não levou mais de meia hora para que nosso comandante chegasse, passasse um sermão em todos. Entregou-nos cassetetes de borracha para concluir a guarda. Na manhã seguinte, na instrução, ele colocou os 70 atiradores à sua frente, cara a cara, e pediu para que os participantes da malfadada guarda dessem um passo à frente. Eu, como cabo, dois passos. Contou a todos nossa irresponsabilidade em dormir durante a guarda, disse que seríamos expulsos e que seríamos presos. A mim, chamou de “mocorongo”, cujo significado é pessoa lerda, atrapalhada, desligada. Ao final da instrução, fui até sua sala fazer um alerta: ‘o senhor roubou as armas, e se as levou para sua casa, cuidado com seus filhos, pois elas estão carregadas, prontas para o disparo’. Ele me expulsou da sala.
No dia 21 de outubro, véspera do aniversário da cidade, todos nós fomos até o salão de treinamento limpar os fuzis para o desfile. Sete atiradores se depararam com seus fuzis cheios de balas: eram os fuzis ‘roubados’ pelo sargento e cuidadosamente armazenados em seu gabinete. Assim, a farsa foi desfeita. Nós, que fazíamos a guarda naquela noite, rimos de alegria e satisfação. Obviamente, não fomos punidos. Esse era o espírito gozador de nosso comandante”.
(Continua na próxima edição)