Retornando ao Boteco, o atleta do Mogi Rugby, Rodrigo Cardoso, o Oliver, aborda a tradição do terceiro tempo, confraternização regada a cerveja, e explica como um esporte bruto torna homens mais cavalheiros.
Boteco – Acontecem muitas histórias nas viagens aos jogos?
Oliver – Geralmente o pessoal volta bêbado, porque saiu do terceiro tempo.
Boteco – Aí já quer ir para outra festa?
Oliver – Poucos conseguem, porque o rugby já consumiu bastante. Dorme e fica uns três dias dolorido.
Boteco – Tem jogador que vai só pelo terceiro tempo?
Oliver – Eu acho que todos vão por causa do terceiro tempo (risos). Todos jogam por causa do terceiro tempo, porque não existe rugby sem terceiro tempo. Ah, vai ter um jogo de rugby, você já sabe que tem o terceiro tempo. No mundo, é assim. No último Mundial, na Nova Zelândia, teve um cara da seleção da Itália que a esposa abandonou ele no meio da Copa do Mundo, porque o cara só ia para o terceiro tempo e não voltava mais. Terceiro tempo é mundial.
Boteco – Muitas curiosidades nos terceiros tempos?
Oliver – Abre com o “morde bunda”. Quando uma pessoa faz um ponto, o try, pela primeira vez, ganha um morde bunda. A gente deita o jogador no chão. Aí tem as pessoas famintas. Toda equipe tem um faminto por bunda. Aí abaixa o shorts e ele ganha umas mordidinhas na bunda. Muita gente morde.
Boteco – No rugby, há atletas de perfil que surpreende?
Oliver – Tem uns gordinhos que fazem miséria. Você fala não acredita que o cara corre esse tanto. Ele pega a bola, sai correndo, ninguém derruba ele.
Boteco – E os mais fraquinhos?
Oliver – Os mais fraquinhos a gente imagina que vão pegar a bola, sair correndo e fazer o try e geralmente é o que acontece. Mas tem os magrinhos que conseguem pegar um cara que pesa quase o dobro e derrubar.
Boteco – Isso é treinado, tem a técnica para derrubar?
Oliver – Existe a técnica para derrubar e por incrível que pareça para cair também. Porque se cair de qualquer jeito, pode quebrar o braço, deslocar o ombro.
Boteco – Como é o trabalho do técnico para formar o atleta?
Oliver – O trabalho de uma pessoa que quer implementar o rugby é fazer entender que o rugby é importante não só com relação ao esporte, mas ao estilo de vida, cultura. Ele prega demais o companheirismo, respeito, educação.
Boteco – Quando você fala em estilo de vida, qual é?
Oliver – É o respeito e companheirismo. Eu ia em campo de futebol, adorava ficar xingando o bandeirinha, o árbitro, saia até rouco do estádio, hoje não faço mais.
Boteco – Como é passada essa cultura?
Oliver – No treino a gente fala bastante para o atleta o que pode e o que não pode. Mas infelizmente é só no jogo que você consegue corrigir, porque a arbitragem é implacável. O capitão fala com o árbitro, ninguém mais. Se outro falar pode tomar cartão amarelo. Cartão amarelo não é igual o futebol que acumula três e ele vai ser punido. Se você tomou um, fica 10 minutos fora. O fato de levar um cartão decide um jogo. O atleta que toma um cartão se cobra demais, os companheiros cobram ele. A regra educa.
Boteco – Ao mesmo tempo em que parece bruto é de respeito?
Oliver – O pessoal fala, tem uma frase muito antiga, que o rugby é um esporte de cavalos jogado por cavalheiros e o futebol um esporte de cavalheiros jogado por cavalos.
Boteco – Oliver retorna no sábado para o último capítulo de suas histórias, desta vez recordando confusões da época em que atuou como mesário e bandeirinha no futebol amador.