EVERTON ZANIBONI
FERNANDO SURUR
A medalha no peito e o dedo anelar da mão direita quebrado são as marcas daquela tarde de quinta-feira, que o enfermeiro Ednilson Cristiano Faria, de 40 anos, não deve esquecer tão cedo. Ele é um dos sobreviventes da tragédia que Mogi Mirim assistiu de perto e se emocionou, ao ver dois mortos na queda da parte de cima de um abrigo de concreto, à Rua Ulhôa Cintra, centro da cidade. O crucifixo que ele passou a carregar foi dado pela mãe, após o susto do filho, que acredita que um poder divino o fez escapar da morte.
O homem, morador do bairro Nossa Senhora das Graças, em Mogi Guaçu, recebeu a reportagem em sua residência na tarde de segunda-feira. Ele admitiu que poucas vezes esperava pelo transporte público naquele local. Ednílson havia saído da faculdade onde estuda e, estando desempregado no momento, aproveitou para entregar um currículo na Santa Casa de Misericórdia. Eram 13h20 quando tudo aconteceu.
“Eu estava embaixo da árvore no ponto (de táxi). Alguma coisa falava para não ficar embaixo do ponto, mas sim da árvore que o ônibus iria demorar”, conta. “Tinham quatro pessoas no ponto. A cobradora estava do meu lado, perto da árvore, falando ao celular. Ela dizia, ó, fica com Deus, daqui a pouco a mamãe está chegando em casa, aí ela desligou o celular. Nisso o ônibus desceu (a rua), ela foi na frente, eu fechei minha mochila e fui atrás dela. Ela entrou debaixo do abrigo, o ônibus veio devagar e bateu no abrigo”, recordou.
Ednilson afirmou que no momento da queda, parte do concreto bateu em sua perna, jogando-o para trás. Quando se deu conta do que havia acontecido, levantou, ainda atordoado, empurrou parte da marquise com a ajuda de outros munícipes e, como enfermeiro, logo foi tentar salvar a vida de Benedito e Luciene. “Levantei atordoado e o motorista veio e perguntou se estava tudo bem. Fui fazer a manobra de ressuscitação, mas a moça já estava em óbito. O senhor ainda teve alguns espasmos, mas não resistiu”, relembrou.
De acordo com ele, tudo aconteceu em questão de segundos. “Foi muito rápido, ele (ônibus) veio devagar, parando, só escutei o barulho, bateu e caiu, como se fosse dominó. “Ele estava, acho, que uns 60 centímetros do ponto, a hora que veio foi muito rápido, não deu tempo de nada”.
Ednílson relata que o motorista se desesperou após o ocorrido, assim como uma outra cobradora, que falando ao celular, chorava copiosamente.
Do além
Emocionado, ele conta que no momento do acidente, sentiu algo lhe tirando dali. “Engraçado que parece que alguém me puxou pela cintura, olhei e não tinha ninguém ali perto, achei muito incrível. O pessoal fala para mim que meu anjo da guarda estava de plantão”, disse, logo admitindo que as últimas noites não foram nada agradáveis.
“Eu fiquei em estado de choque, duas noites sem dormir, agora que comecei a melhorar. Mesmo assim, acordo assustado de noite, a toda hora você vê o momento do acidente. Às vezes vêm os flashes, lembro e é muito triste”, desabafou.
Sem esconder o trauma, afirma que será difícil esquecer a última quinta-feira tão cedo. “Só o tempo que vai falar, mas o choque é grande”, completou.