Vivemos ainda momentos traumáticos no Brasil e no mundo. A pandemia permanece como um grande desafio. A bem da verdade, nenhum de nós tem a menor ideia, nem por proximidade, de quando enfim venceremos a Covid-19.
Há dois anos, não havia uma só evidência de que enfrentaríamos a mais severa de todas as crises sanitárias da história. Por forças das circunstâncias, hoje, estamos em estado de plantão permanente em contendas pela saúde e a vida.
Cresce a importância, assim, da telemedicina e de suas inúmeras possibilidades. Ela certamente “pode” garantir boa funcionalidade e eficácia ao processo de reversão da demanda reprimida do Sistema Único de Saúde (SUS). Isso para ficar apenas em um exemplo que pede ação urgente e efetiva.
O quadro preocupa: somente entre março e junho de 2020, quatro primeiros meses da pandemia de Covid-19, houve redução de 61,4% nas cirurgias eletivas realizadas no SUS, conforme dados do Ministério da Saúde.
O Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) estima que algo em torno de 700 milhões de procedimentos ambulatoriais e hospitalares deixaram de ser efetivados na rede pública, também em decorrência do SARS-CoV-2.
Destaco que são números do início do caos Covid, tendo a situação se agravado demais de então até agora. Tive cuidado e propósito ao frisar que a telemedicina “pode” ser essencial no enfrentamento à demanda reprimida (e a muitos outros, claro). O uso do condicional é simplesmente porque ainda não existe regulamentação legal no Brasil. Um marco regulatório para a utilização das tecnologias em Medicina está em debate agora no Congresso Nacional.
A Associação Médica Brasileira acompanha as discussões com regularidade. Convida todos os médicos a também manter os olhos abertos, para evitar a aprovação de propostas que ameaçam nossas prerrogativas de melhor escolha, autonomia e decisão.
Defendemos que o médico tenha garantida a liberdade ética de ação no âmbito da telemedicina, como em todos os outros. Cabe exclusivamente a ele considerar como válida ou não, segundo sua própria avaliação, a primeira consulta feita por meio de plataformas digitais.
A relação médico-paciente é a base da boa assistência quando associada às evidências científicas vigentes. Isto sim é a verdadeira autonomia do médico.
Aliás, quando à frente de possibilidades de bases sólidas e resultados comprovadamente satisfatórios, cabe ao médico decidir sempre. Às nossas entidades, fica a responsabilidade de resguardar esse direito, zelando para que não nos sejam apresentados caminhos que levem a precipícios e desastres. Ao fim da estrada da boa prática, todos devem ganhar.
* César Eduardo Fernandes é presidente da Associação Médica Brasileira