A base para a construção de uma carreira nem sempre é uma estrutura pré-moldada. Ainda assim, as várias peças que compõem a vida de uma pessoa são vitais para que esta obra se materialize. Letícia Müller nasceu por aqui, em Mogi Mirim, em 7 de abril de 1981. Hoje é advogada, formada na primeira turma da Faculdade de Direito de Mogi Mirim, em 2006. Mas nunca se viu na área.
“Meu tio Nelson, que era casado com minha tia Neusa Mazelli, sempre falava que, se eu fosse filha dele, eu seria advogada. Eu nunca me imaginei advogada. Minha família é de parque de diversões. Minha avó materna era dona do Parque Bela Vista”. Letícia começou a trabalhar ainda criança. Com 13 anos, foi empacotadora de mercado. E pegava seu salário para comprar doce no Comercial Santa Helena e vender na escola. Empreendia.
Agora, reúne quase 15 anos na profissão que escolheu, mas, como se vê, outras opções existiam. “Antes de fazer direito fui fazer engenharia de alimentos da Unimep, em Santa Bárbara d’Oeste. Odiei”, recorda a advogada. Ingressou, então, na recém-criada Faculdade de Direito de Mogi Mirim. “Logo no primeiro ano eu me encantei com o direito”.
E também começou seu estágio. Na Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), de Mogi Guaçu, esteve ao lado da delegada Judite de Oliveira. Depois, atuou no escritório Oliveira Dorim e Franco. “Eu usava uma máquina de escrever na delegacia (risos). Aí fiquei por 11 anos no mesmo escritório. Depois fui para a (rua) João Teodoro, onde trabalham vários outros advogados, cada um na sua área”.
Ela enfatiza que gostava de ajudar as pessoas. De orientar. E que sempre teve muita paciência. “Então, quando a situação ficava complicada, eu conseguia contornar. Na área de família e crime você tem que ouvir. No processo de família, às vezes, só falta o diálogo. No crime as famílias são condenadas junto com os réus. Mãe sofre. Ficar preso não é fácil. A sociedade cobra. Procuro dar o máximo de atenção possível às famílias”.
A trajetória profissional conduziu Letícia a se dedicar a estas áreas. Mas a vida como um todo também constrói um advogado. “Meus pais se divorciaram quando eu tinha dois anos. Minha mãe era maluca, mas tinha três empregos. Eu sempre vi a verdade nua e crua”. Nesta caminhada, muitos casos e causos. “Tem cliente que eu pedi a pensão, fiz execução e agora faço alimentos para os netos. Vi nascer e agora já é mãe”. Além destes encontros, há as situações que marcam a carreira de quem milita na área.
“Tem um caso muito curioso, criminal. Tenho um cliente que foi reconhecido por foto como sendo autor de um roubo. Porém, poucos dias antes do ocorrido, ele havia feito um transplante de córnea. E mesmo assim ficou preso. Como ele poderia ter roubado alguém de bicicleta se nem enxergava? Que luta. Só na audiência que as vítimas falaram que não era ele. Que dó. Sofreu”.
Para ela, seu processo mais difícil foi o júri que condenou Maicon Alexandre Bepler pela morte do advogado Lorenzo Andrade de Moraes. “Foram mais de 15 horas. Réu condenado. E, no final, o juiz se levantou e falou que tudo aquilo era uma tragédia e que lamentava por ambas as partes. Aí, quando eu olho, a mãe da vítima abraçando a mãe do réu. A mãe da vítima é evoluída ao extremo”.
Por mais que, na ótica de quem trabalha na área criminal, haja uma visão de caos dos presídios, sobretudo na pandemia, é inegável que a Justiça está mais célere. “Do começo da carreira para cá mudou muito. Antigamente as ações eram gigantescas, com 50 laudas. Não dá. Temos que cooperar com os juízes. Fato, fundamento e pedido. Prova e só. Sem delongas”.
Aí já está uma dica a quem está ingressando na área. Mas, Letícia vai além. “Eu falaria para eles, primeiro, que estudem muito. Desde o primeiro ano. Se quer e pretende fazer faculdade, qualquer uma, faça bem feito. E tanto para o estudante ou para quem está começando, eu digo: tenha sempre humildade”. Sabendo de seu potencial e reconhecendo suas limitações, Letícia é uma apaixonada por esta profissão milenar.
“O que me encanta é o direito ser tridimensional. Quando tem litígio ninguém sai muito feliz. As pessoas não se toleram mais. E é prazeroso quando você é reconhecida. Quando um acordo coloca fim ao litígio. Mas, depende de qual lado você está. É literalmente a balança, justiça x injustiça e a ganância ainda vai matar muita gente”. Mais um motivo para que o direito tenha sua relevância exaltada.