Cada um entrega aquilo de que é nutrido. Todas as vezes que paro para pensar sobre a moda da “missão”, acabo no cuidado. É o que eu mais gosto de fazer na vida. Cama cheirosa, planta molhada, criança limpinha, cabelo hidratado, roupa passada. Faz parte de mim dar carona, levar no médico, no veterinário, fazer bolo e oferecer café.
Certa vez fui dormir com um tio avô no hospital. É o tipo de coisa que ninguém gosta, mas, acabou como uma doce lembrança. Fizemos um bem bolado com o papagaio de xixi para que não nos constrangêssemos e passamos a maior parte da noite chuvosa trocando histórias.
Acontece que cuidar é vizinho de parede-meia com a ingratidão. A grande sacada, porém, para não se decepcionar, é reconhecer o limite dos sentimentos envolvidos na equação: o nosso, o do outro e o da situação.
Tem gente que não conhece amor e, por isso, não sabe lidar com ele. Não adianta oferecer. Desta forma, suas atitudes devem sempre estar alinhadas com seu coração e não com o outro. Talvez seja isso que Jesus pregou sobre dar a outra face. É sobre manter a doçura diante do amargor, é continuar oferecendo tudo enquanto devolvem migalhas.
Quem é mulher vai me entender. Eu não consigo comprar nada, nadinha quando estou com cólica. A vendedora pode ser a melhor do mundo, pode dar 70% de desconto, entregar na minha casa enquanto faz massagem no meu pé que não vou levar. Não tem a ver com ela, é comigo.
A única atitude que podemos ter diante de se sentir injustiçado, deixado de lado, de escanteio, é avaliar o nosso interno. Fiz o que podia ou estava ao meu alcance por ele? Agi da forma que gostaria que tivesse sido comigo se estivesse precisando de ajuda? Se diante da resposta a consciência estiver tranquila, não há nada a fazer além de seguir avante distribuindo aquilo que faz seu coração bater.
Essa pressão é comum na família, invariavelmente da fase que esteja vivendo. Acontece quando a criança é de colo e quer pegar algum objeto que negamos. Ocorre quando decidimos se deixar ir naquele rolê é “de boa” ou não. Quando seu marido quer um pagode enquanto você não contava os minutos para ler na rede. Sempre será questão de escolha.
Ainda assim, quantas vezes alguém nos trata com frieza, com mau humor e ficamos bagunçados tentando compreender o motivo. Relacionar-se é sempre uma vida de duas mãos, não é unilateral, embora sejamos educados como se fosse. Na minha geração, chegou em casa falando que deu problema na escola, a culpa era sua, sempre! Se chefe ficou bravo, merecido!
Claro que carrego arrependimentos, principalmente em relação aos meus filhos, mas eles são basicamente de atitudes que teria diferente, não de sentimentos. Uma dúvida que não carrego é a de que amei e cuidei com o capricho que se tem com os preciosos. No final, para mim, o que vale mesmo é ter sido quem se sabe ser.